Blog do Pedro Hauck: junho 2011

27 de junho de 2011

Jurandir Constantino, o Marumbinista 82

Recentemente pude caminhar à companhia de uma pessoa que há muito tempo conhecia, mas que nunca havia tido a oportunidade de dividir um perrengue, trata-se do Jurandir Constantino.

O Jurandir é um cara muito bacana, que tem muita história pra contar. A primeira coisa é por que ele é o marumbinista 82? Bem, essa história ele me contou agora! Ele é uma das poucas pessoas que pode ser chamada de marumbinista de verdade, isso porque ele morou na estação do Marumbi por 11 anos, de 1982 até 1993, daí o 82.


 Jurandir caminhando na Serra do Mar

O pai do Jurandir trabalhava na RFFSA e ele morou onde hoje é a sede do Parque Estadual do Marumbi. Ele me contou suas histórias de criança. Escaladas em árvores, e aventuras no Rochedinho, numa época em que subir o Olimpo era inalcansável. Seus idolos eram os montanhistas que frequentavam a vila e contavam as histórias de montanhismo.

Era uma época diferente, cheia de liberdade. O Marumbi era para todos e apesar disso ser bom, haviam problemas, como o lixo. Porém até este defeito se tornava diversão, pois todos os anos era realizado gincanas de limpeza organizada pelo CPM e patrocinada pela Acampar, que doava mochilas e equipamentos para os mais empenhados. Haviam uns que até trapaceavam, colocando no meio do lixo folhas e terra, pra pesar mais. No final, quem trazia pra estação mais resíduos, ganhava o premio maior, uma mochila. Por várias vezes o Feijoada, que também venceu duas vezes o Marumby Trophy, levou a melhor.


 O Marumbi do Jurandir

Certa vez, o pai do Jurandir ganhou dois porcos. Ele pegou uns dormentes de trem e com eles fez um chiqueiro. Hoje ele me conta esta história rindo: 

_ Imagine, uma chiqueiro no Marumbi?

Pobre dos porquinhos, foram mortos por uma das maiores tragédias da história da montanha, as avalanches de março de 1989. 

Nesta ocasião, começou a chover demais num final de tarde. O pai do Jurandir chegou mais cedo em casa e viu a água invadir aos poucos a vila. Rapidamente o rio Itapava começou a transbordar e passar suas águas sobre a ponte do trilho de trem. Primeiro vieram arbustos, depois árvores inteiras e a casa do Jurandir ficou meio metro abaixo de água. Diversos moradores tiveram que ser socorridos. É dificil imaginar a estação debaixo d´água, mas foi isso que aconteceu.

Os porcos foram levados com água e o corpo de somente um foi achado, há mais de um quilometro de distância. Pedras se moveram e neste evento climático anormal, quase repetido neste ano, boa parte do leito do rio foi destruida, aflorando rocha onde antes tinha solo, mas deixando cachoeiras maiores e mais bonitas.

Hoje quando vamos para o Olimpo e passamos pela cachoeira dos marumbinistas, não imaginamos que não havia tanta rocha exposta quanto hoje e que aquele vale inteiro foi arrasado. 

Os tempos mudaram e o Jurandir também. Mas mesmo assim ele não deixou de frequentar a montanha. Depois disso ele foi morar em Alexandra, e nos finais de semana ia de bicicleta até a estação para depois fazer o conjunto. Quem conhece sabe que isso é uma grande pernada!

 Jurandir bivacando na chuva. Não tem tempo ruim pra ele!

Hoje o Jurandir mora em Paranaguá e trabalha na secretaria de meio ambiente. Com uma história dessas, tinha mesmo que gostar de mato e natureza. Este é o Jurandir, um grande montanhista e companheiro, um verdadeiro marumbinista. Tão dedicado ao montanhismo que dizem que tem até uma montanha na Serra do Mar foi batizada em sua homenagem. 

Um grande abraço pro Jurandir!


Jurandir antes e depois de devorar uma Tainha em Paranaguá.

22 de junho de 2011

Geo Caratuva

Na semana em que eu escrevo sobre Humboldt, volto à Serra do Mar com o objetivo de fazer mais montanhismo científico. Desde vez fui acompanhado pelo Prof. Dr. José Manoel Reis Neto, do Laboratório de Análises de Minerais e Rochas da UFPR e da Laís, orientanda de mestrado em Geologia exploratória na mesma Universidade.

Após finalizar a disciplina Fundamentos de Geologia do Programa de Pós Graduação, propus este campo para alinhar conhecimentos e testar habilidades em interpretar os sinais sutis da paisagem que contam sua evolução e origens. A linguagem é bem diferente de nosso português sendo descrita por depósitos, sua granulometria, composição, direção de movimento de falhas, enfim, observar e interpretar estes dados que estão na paisagem e que poucos notam.

O destino foi o Pico do Caratuva, tradicional local para prática de montanhismo na Serra do Mar, onde geralmente é realizado um montanhismo contemplativo baseado na apreciação da beleza cênica.
Logo no caminho, nos deparamos com alguns dos sinais que contam a história da Serra do Mar.

Primeiro foi um afloramento de material mal selecionado, com areias, argilas e calhaus, localizados em baixa vertente em local próximo à área fonte e transportado por água, que esteve presente somente na fase de transporte e ausente na intemperização deste material. Qual seria a idade, qual seria o evento deposicional, como seria a paisagem na época da deposição destes sedimentos?




Visão geral e detalhes do afloramento

As areias são Arcósios, não apresentam intemperismo. As camadas ora com areias, ora com seixos, mostram uma alteração na energia no transporte, como fases com chuvas torrenciais e outras sem estas chuvas. A idéia é que isso tenha ocorrido num período de clima semi-árido, onde a vegetação é suprimida e as ocasionais chuvas, que podem ser torrenciais, tem o poder de destruir solos e transporta-los a curta distância. Isso explica os seixos e também as areais pouco intemperisadas, além da localização em baixada.

A próxima parada é um afloramente de latossolos, que é o tipo de solo mais evoluído que há. Neste afloramento há a ocorrência de blocos no interior deste solo. São rochas mais resistentes à pedogênese que se mantem inalteradas no perfil. Se por uma mudança climática este solo é removido, estes blocos são empilhados um sobre outro, formando os chamados "caos de blocos", ou relevo de Tor.


Blocos em subsuperfície e esquema mostrando sua evolução na visão de Twidale (Analyses of landforms)

Na sequencia chegamos à Fazenda Pico Paraná e pudemos observar estes blocos em superfície. É o Morro do Getúlio, que na verdade é uma crista do Caratuva. Ali podemos notar não somente o resultado de um processo de desnudação do solo, mas também fraturas com movimento de estruturas, ou seja: falhas!

Morro do Getulio


São dois alinhamentos de falhas, uma que faz o sentido Leste - Oeste e outra paralela à orla do mar. Quais seriam as origens destas falhas? Elas tem relação com a abertura do atlantico? Houveram movimentos ascencionais em nossa Serra?

Não apenas isso o que intriga. Além destes elementos, ainda temos em diversos patamares superficies planas no meio da montanha que são sustentadas por lateritas, ou seja, Ferro. Estas lateritas tem uma origem em climas tropicais seco-umido, tipico de cerrado. Elas teriam então que ter sido evoluidas em ambientes planos com um clima diferente do atual. Por que estão ali, que idade tem?

 Laterita na trilha

José Manoel visualizando o relevo no Google Earth durante o campo

Apenas para terminar as indagações, há ainda os processos que ocorrem na atualidade. A mesma falha Norte Sul que está pouco pronunciada no Planalto, é um grande canyon no lado do litoral, isso porque ali a erosão remontante foi muito maior.

 Vista do Caratuva em direção ao Atlântico, com o Pico Paraná em primeiro plano

 Vista para o Serra do Mar (norte)

 José Manoel observa sinais de avalanche nas encontas do Taipabuçu

Vista para a Serra do Mar (Sul)

Neste momento é facil observar e fazer perguntas. Ainda que dificil, é possível obter a resposta para todas estas perguntas e com isso, podemos montar um quebra cabeças e saber como e quando a Serra do Mar foi tomando suas formas. Também podemos com isso saber melhor sobre sua dinâmica, velocidade de evolução e tendências. Fala-se tanto em desastres e prevenção deles, mas pouco sabemos sobre as forças da natureza que moldam estas paisagens e condicionam estes eventos que podem ser muito problemáticos para o homem.

Dias melhores estão para vir!
 

19 de junho de 2011

Mais Capivaris

A Serra do Capivari é, um bloco montanhoso localizado ao norte da Serra do Mar paranaense que, como disse anteriorente, recebe pouca atenção dos montanhistas. Seu ponto culminante, o Capivari Grande, é uma das mais altas elevações do Estado e do Sul do Brasil. Estive nesta montanha na semana passada e fiquei com vontade de revisitar o Capivari Mirim e tentar uma investida ao Médio.

A previsão do tempo para este final de semana não era a melhor possível: Chuva sábado e domingo. Porém, para surpresa geral, o tempo no sábado amanheceu lindo e mudando totalmente os planos, a Camila quis ir para uma montanha e na hora pensei nos Capivaris. Acabamos saindo de Curitiba, horas mais tarde, eu, a Camila, Lourdes, Minhoca e o Mário, pra pegar uma trilha noturna.

Tive um pouco de dificuldade de me guiar pelos campos da montanha à noite, ainda mais porque até umas 10 da noite a lua não tinha nascido. A recompensa pela teimosia se deu quando chegamos ao cume e pegamos a linda lua cheia e um visual maravilhoso.

Tive um noite tranquila e estranhamente acordei com as primeiras luzes do dia, coisa que não faço muito a menudo. Foi um outro presente poder acompanhar o nascer de um belo dia.

A caminhada do Mirim até o Médio foi outro grande presente. Em 2008 eu participei da reabertura desta trilha esquecida, mas cheguei somente até o Mirim e parei ali por causa do calor avassalador. Desta vez fui à procura do caminho aberto por meus amigos Marcelo Brotto, Rafael Völtz e Pacheco.

A trilha está aberta, mas não pela presença de montanhistas, mas sim por conta de uma Anta que vive na montanha. Encontramos seus rastros e fezes. A Anta é o maior mamífero terrestre do Brasil e está em extinção.

No estreito cume do Capivari Mirim, encontramos o caderno de cume deixado por nossos amigos em 2008. De lá pra cá apenas três grupos de pessoas estiveram lá. No começo do ano, o Brotto com o Toninho e Schmall, ontem, um dia antes de nós o Brotto novamente e o Völtz com a namorada. Eles substuiram o caderno de 2008 que molhou, mas esqueceram de deixar uma caneta.

Abaixo as fotos do dia mais bonito do ano até agora:

 Noite linda! Sem tripé foi o que deu pra captar

 Primeiras luzes do dia com o Capivari Grande na frente

 Acampamento no Cap. Mirim

 Mar de nuvens com lua cheia ao amanhecer



 Eu, Cami e a Lú



 Primeiros raios de sol

 Capivari Gde e o sol





 Vista linda para o Ibitiraquire


 Capivari Mirim visto da trilha para o Médio

 Dentro da trilha

 Bela matinha nebular

 Pegada e fezes de anta na trilha


 Vista para todas as montanhas

 Galera no cume

 Improvisando um lápis


 Planta carnívora



13 de junho de 2011

Cinzas de vulcão na Serra do Mar

Sexta feira foi o dia em que as cinzas do vulcão Puyehue chegaram em Curitiba. Aqui na cidade não dava pra ver nada demais, só o céu azul, condição de tempo ideal para um dia de montanha que eu não tive como desperdiçar.

Quase sem querer encontrei o Jhony no msn e o convidei para ir pra Serra do Capivari, uma serra montanhosa esquecida ao norte do Ibitiraquire. Lugar de fácil acesso e vista bonita pro resto da Serra do Mar.

Devido à um acidente na estrada, envolvendo uma cegonheira cheia de carros importados, chegamos tarde na montanha, mas à tempo de ver o sol se pôr, num cenário bastante poluído.

Eram as cinzas do vulcão, pouco visíveis da cidade, embaçou a vista para o resto da Serra do Mar, num dia que era pra ser muito limpo, já que um dia antes havia caído muita chuva, tanto que a trilha ainda estava molhada.

Enfim, foram cinzas importadas do Chile, ainda que bem disperças na atmosfera, elas estavam ali... Bem que podia ter um vulcanismo por aqui!

 Dia empoeirado

 Jhony

Antenas do Capivari


 Vista do Ibitiraquire desde o Capivari Grande

Muita poeira!