Blog do Pedro Hauck: novembro 2007

6 de novembro de 2007

Quer uma aguinha com açúcar?

Quando escalar é o mais fácil

Andar no meio da floresta úmida, se enroscar nos taquarais, furar a mão nos espinhos dos Samambaiaçus, atravessar rios encachoeirados com pedras musguentas e escorregadias, não menos que a própria trilha, encharcada pela chuva que nunca acaba, mesmo quando ela não cai do céu, mas sim das folhas das árvores que estão sempre molhadas...

Este cenário típico das florestas que bordejam o oceano atlântico no Brasil já foi para mim o cenário de minhas aventuras. Quantas vezes me perdi na diversidade confusa da Mata Atlântica?

Acontece que aos poucos fui parando de ir para a mata e cada vez mais comecei a me dedicar somente à escalada técnica, esportiva até demais!

Muitas pessoas acham que esta é a evolução natural de um montanhista. Pode até ser. Entretanto as travessias nas encostas florestadas não são fáceis. Eu tinha até esquecido como complicado é navegar, se achar e ficar em pé nestas trilhas lamacentas (alguém já jogou boliche humano?).

A Serra do Mar no Paraná é um lugar onde o montanhismo começa na Mata. Quase toda montanha aqui é circundada por Floresta que você tem que atravessar.

Há séculos estas florestas são exploradas, seja economicamente ou não. Um exemplo é a atividade madereira que é explorada aqui há muito tempo. Outro, é o caminho do Itupava, uma antiga trilha de mula que ao seu redor se desenvolvia toda a economia do Paraná no século XVIII, assim como concentrava a maior parte da população. Ou seja, a Floresta que nos parece intocada, não tem nada de selvagem, mas sua incrível capacidade de regeneração faz com que ela seja de difícil domesticação.

A parte mais interessante desta característica natural da floresta, é que andando nela, você tem a impressão de ser um pioneiro explorando-a. Isso não deixa de ser verdade, pois a Floresta que você conheceu hoje é diferente da que você conheceu ontem, pois neste tempo as folhas caíram tampando suas pegadas, as árvores velhas também, abrindo novas clareiras confundindo sua percepção maqueando a trilha anteriormente existente. As epífitas crescem sobre os troncos, apagando qualquer tentativa de demarcar seu caminho. Então, por mais que você conheça a trilha, toda experiência é uma experiência nova. Foi como o Julio (Fiori) falou:

"Há mais de vinte anos venho para esta trilha para me perder".

Então, quem foi que disse que este montanhismo tradicional é fácil?

Além do enorme senso de direção e navegação, o montanhista ainda tem que saber lidar com a floresta, aprender com o mateiro como penetrá-la, ter cuidado com a vida oculta, não se importar com os mosquitos que te sugam todo o sangue, se acostumar com a umidade constante que te encharca até a cueca.

Não existe equipamento bom para este montanhismo. Andar pela mata com anorak de Goretex? Esqueça!

O melhor equipamento às vezes, é aquele que o mateiro usa: Bota sete léguas, camiseta e calça velha (vão rasgar nas taquaras mesmo!) e não esqueça do facão bem afiado.

Escalar o Aconcagua é fácil. A trilha está lá, todo mundo vê. Escalar no Paraná é que é dificil. Pois você não vê trilha e nem a montanha.

Depois de perdido e fudido, desesperado molhado e cansado, nada vale a experiência de ter ido aos Andes e ao Himalaia... O paranaense, acostumado com o mato de sua Serra do Mar chega para você com calma e diz:

_ Quer uma aguinha com açúcar?
Aspecto do interior da Floresta úmida. Rain Forest para quem não é daqui.

Como não se encharcar numa trilha dessa! (ps. a trilha é o rio!)

Acampando onde o mato deixa

Animais ocultos

Infeliz atividade econômica de um pais que não sabe aproveitar suas potencialidade paisagísticas