Ontem um antes de me recolher o tempo limpou e junto com as nuvens se foi meu pensamento negativo.
Até tinha motivos pra isso. Havíamos caminhado super pouco. O tempo estava horrível, não consegui me despedir da Maria e soube que durante o trekking e escalada do Mera, não conseguiria falar com ela e nem ter noticias de casa. Além disso Chutang estava longe de ser um local bacana.
Porém quando o céu limpou, consegui ver o Kongde, as estrelas e até apareceu uma família de yaks com filhotes para eu bisbilhotar. Mesmo assim fui dormir cedo.
Acordei as 5:30 da manhã naturalmente. Arrumei a mochila e um pouco depois Tendu acordou para tomarmos café. Comi um chapati com café solúvel e depois veio a conta. Contando o jantar, a hospedagem e o salário de Tendu, gastei logo no primeiro dia, convertendo para reais, R$100.00.
Comecei a caminhada sem pensar no dinheiro, mas é claro que isso é uma preocupação. Além de Tendu, que é um trekking Sherpa, eu já paguei 500 usd para o climbing Sherpa que irá me acompanhar na escalada. Eu terei que pagar a alimentação de meu companheiro, uma permissão de trekking, o aluguel de uma barraca no Mera e gratificação para os 2 sherpas. Tudo isso vai me custar uns 1500 dólares, para fazer uma única montanha!
Mesmo que vc queira vir o maximo independente, não tem oque fazer. Aqui é preciso pagar por tudo. Diga-se de passagem o preço da permissão para escalar um 6 mil é de 250 usd. Um 7 mil vai para 7 mil usd e um 8 mil nem se fala. Se for o Everest, prepare-se para vender sua casa e seu carro. Aqui estão as montanhas mais altas e também as mais caras do mundo.
Vamos subindo a trilha tranquilamente. De tempo em tempos Tendu pergunta se minha mochila está pesada. Ele nunca viu um gringo carregar tanta coisa e diz que a minha mochila é de Sherpa.
Como guia de trekking Tendu está acostumado a ser uma mãe. Exatamente por isso o plano dele para a aproximação ao Mera é super conservador. Por isso caminhamos tão pouco no dia anterior.
Após caminhar 30 minutos passamos por "upper" Chutang e o mesmo tempo depois passamos por outro vilarejo, já a 4 mil metros. Se eu soubesse que havia estas opções jamais teria parado em "lower" Chutang. Porém não disse nada a Tendu. Melhor deixar ele perceber sozinho com quem está andando.
Em pouco tempo atravessamos uma zona de floresta que vira uma Matinha Nebular como em nossa Serra do Mar. Aliás o tempo já começa a piorar e de fato somos envoltos por uma névoa.
Chegando nos campos de altitude, que tinham muitos manchões de neve. Cruzo pela primeira vez com ocidentais. Era um casal de alemães que avisam que o passo está próximo.
Apesar de ser o segundo dia, este é o pior de todos. Chutang está a 3 mil metros, o passo de Zatrwa la está a 4700. São simplesmente 1700 metros de desnível para subir e descer. Um ataque ao cume que no meu caso é feito com mochila cargueira nas costas. Mas não estou nem aí.
No meio da neblina consigo ver bandeirinhas de oração e no meio delas meu Sherpa avisa que chegamos no Passo.
Paramos para tirar foto e para comer um chocolate, afinal só a energia do chapati não é suficiente para 1700 metros de ascensão.
O tempo não melhora e continuamos nossa caminhada. No entanto, ao invés de descer continuamos a subir por mais uma hora, quando enfim chegamos a outro passo e de lá, enfim, começamos a descida.
Uma hora depois chegamos em Thuli kharka que é uma pousada com restaurante de madeira. Paramos lá para comer.
Pedi um macarrão frito com legumes. No meio da refeição chega um japonês que se admira com o tamanho de minha mochila. Ele estava super cansado e sujo. Vinha do Mera e me deu ânimo, dizendo que para mim seria fácil. Após o almoço preparo um café de verdade para ele e meu Sherpa e voltamos à caminhada.
Cruzamos um altiplano com vegetação rasteira e manchas de neve. E após uma hora começa a descida brava.
Novamente saímos do campo e adentramos a mata literalmente Nebular e após uma hora estamos no meio de uma linda floresta de Ginepros, um pinheiro parecido com a Araucaria, minha árvore favorita.
A atmosfera é mágica. Pra ficar ainda melhor, estamos perto de um lodge com lugares disponíveis. É lá que ficaremos. É a região de Tashing Ongma, 3600 metros. Nada mal subir 1700 metros e descer 1100 num único dia com cargueira nas costas.
Agora Tendu está sacando que é diferente "guiar" um montanhista.
Anoitecer em Chutang |
Upper Chutang |
Já onde não há mais árvores |
No passo Zatrwa com Tendu |
Cruzando o passo. |
Floresta de Ginepro e neblina |
Enfim as montanhas |
Tea House onde passei a noite |
Cabana no café da manhã |