:: Leia a parte do relato que antecede esta história
No dia em que descemos do Pissis o tempo virou. Ainda na
trilha, vimos 8 condores planando sobre nossas cabeças, o que achamos que seria
um sinal de boa sorte, mas não foi. Naquela noite ventou muito em Fiambalá e o
céu ficou marrom de areia. De madrugada, quando eu fui à praça central
atualizar este site, cheguei a presenciar um chuvisco, o que é raríssimo
naquela terra, me lembrei de um dito popular de Mendoza que diz: Cuando el condor vuela abajo, montañero al
carajo!
Ao ver as notícias na internet, tive um baque: Meu colega de
montanha Jamil dos Santos, com quem já fiz algumas pernadas na serra do mar,
faleceu. Como pode um cara tão novo, de apenas 42 anos, ir assim de repente?
Em todo o caminho até La Rioja, no dia seguinte, fiquei
pensando nas pessoas que se foram, tanto no Jamil, quanto no meu avô, que
faleceu no ano passado e deixou muitas saudades. Nosso destino também me fazia lembrar
outra pessoa, com quem eu me encontrei diversas vezes entre idas e vindas da
montanha, a Oma Margarita, avó do Maximo, que se foi à pouco tempo também.
A Oma já teve uma casa de veraneio em Chilecito, que é a
principal cidade na base da Serra de Famatina. Várias vezes quando estive na
casa dela em Villa General Belgrano, ela ficava falando de Chilecito e do
Nevado de Famatina, dizendo da antiga mina que lá existia e um teleférico que
levava os minérios até a cidade, descendo “6 mil” metros até lá.
Desta vez não chegamos a ir à Chilecito, nos hospedamos numa
cidade mais próxima à montanha que também se chama Famatina. Aliás, esta
história eu preciso contar mais tarde, pois vivemos uma situação que resume bem
a situação atual da Argentina.
Desde o dia dos 8 condores no Pissis, o tempo está fechado
nas montanhas, com muita neblina e precipitação. A previsão do tempo apontou
uma janela na sexta feira 11 pela manhã, então aproveitamos o dia 10 para subir
até a base da trilha, seguindo o tracklog que o Maximo nos passou.
Subimos os mais de 45 km até a mina abandonada de La
Mejicana. Presenciamos todo o alarde da população contra a reativação da
mineração e fomos parar onde está o começo do teleférico de minérios, a 4400
metros, onde há algumas construções abandonadas há décadas.
Em meio à neblina, foi procurar o começo da trilha do Maximo
em outro vale. Encontrei um caminho razoável que nos leva até lá em 2.4km de
trilha simples, melhor que os 4 desde um acampamento mais abaixo. A neblina e a
lembrança de quem já foi, deu um clima fantasmagórico na montanha. Olhando
todas estas ruínas e pensando que todo mundo que já trabalhou aqui está morto,
aumentou este sentimento.
Acampamos dentro de uma antiga casa de pedra, que segundo me
disseram, tinha cem anos. Montamos a barraca para não ser atropelados pelos
ratos e fizemos um jantar acendendo a lareira de um dos quartos. Fomos dormir
com chuva, acreditando que terminaria em breve, tendo como base pra isso a
previsão Mountain Weather Forecast.
Como combinado, acordei às 2 da manhã. Haviam estrelas no
céu, que desapareceram assim que chamei o Waldemar. Sem esperanças, voltei à
barraca e foi chamado por meu parceiro que falou: _ É pouco provável que se você ficar sentado na beira da montanha, um
pato assado entre na sua boca (provérbio chinês).
Até que a intenção foi boa, mas logo que esquentamos um chá,
a chuva voltou. Esperamos um pouco e ela não se acalmou. Desistimos de ir ao
cume.
Depois que o Waldemar voltou à sua barraca, reacendi a
lareira com algumas brasas que ainda queimavam, e assisti por quase 2 horas as
chamas consumirem a lenha, sozinho naquela escuridão ao som do tinlintar das
gotas de água batendo na telha da velha casa. Talvez tivesse mais gente ali
comigo...
Ao amanhecer vimos que a previsão da janela de tempo estava
certa. O Famatina estava todo branco, mas já não havia tempo. Não adianta uma
janela de tempo pela manhã se na madruga chove. A montanha se fechou novamente
poucas horas depois.
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:: Veja o tracklog do Famatina no Rumos: Navegação em montanhas
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:: Veja o tracklog do Famatina no Rumos: Navegação em montanhas
Protesto contra a reativação da mina La Mejicana. |
Caminho ao Famatina |
Waldemar na porta de nosso "refugio". |
Waldemar com espirito Inca. |
Teleférico com tempo ruim. |
Ouvindo o som da chuva e vendo o fogo na madrugada. |
Teleférico com tempo bom, que durou pouco. |
Famatina nevado. |
Barro amarelo do rio Amarillo. |