Blog do Pedro Hauck: 8 condores e uma montanha fantasma

15 de janeiro de 2013

8 condores e uma montanha fantasma

:: Leia o relato desta expedição desde o começo
:: Leia a parte do relato que antecede esta história

No dia em que descemos do Pissis o tempo virou. Ainda na trilha, vimos 8 condores planando sobre nossas cabeças, o que achamos que seria um sinal de boa sorte, mas não foi. Naquela noite ventou muito em Fiambalá e o céu ficou marrom de areia. De madrugada, quando eu fui à praça central atualizar este site, cheguei a presenciar um chuvisco, o que é raríssimo naquela terra, me lembrei de um dito popular de Mendoza que diz: Cuando el condor vuela abajo, montañero al carajo!

Ao ver as notícias na internet, tive um baque: Meu colega de montanha Jamil dos Santos, com quem já fiz algumas pernadas na serra do mar, faleceu. Como pode um cara tão novo, de apenas 42 anos, ir assim de repente?

Em todo o caminho até La Rioja, no dia seguinte, fiquei pensando nas pessoas que se foram, tanto no Jamil, quanto no meu avô, que faleceu no ano passado e deixou muitas saudades. Nosso destino também me fazia lembrar outra pessoa, com quem eu me encontrei diversas vezes entre idas e vindas da montanha, a Oma Margarita, avó do Maximo, que se foi à pouco tempo também.

A Oma já teve uma casa de veraneio em Chilecito, que é a principal cidade na base da Serra de Famatina. Várias vezes quando estive na casa dela em Villa General Belgrano, ela ficava falando de Chilecito e do Nevado de Famatina, dizendo da antiga mina que lá existia e um teleférico que levava os minérios até a cidade, descendo “6 mil” metros até lá.

Desta vez não chegamos a ir à Chilecito, nos hospedamos numa cidade mais próxima à montanha que também se chama Famatina. Aliás, esta história eu preciso contar mais tarde, pois vivemos uma situação que resume bem a situação atual da Argentina.

Desde o dia dos 8 condores no Pissis, o tempo está fechado nas montanhas, com muita neblina e precipitação. A previsão do tempo apontou uma janela na sexta feira 11 pela manhã, então aproveitamos o dia 10 para subir até a base da trilha, seguindo o tracklog que o Maximo nos passou.

Subimos os mais de 45 km até a mina abandonada de La Mejicana. Presenciamos todo o alarde da população contra a reativação da mineração e fomos parar onde está o começo do teleférico de minérios, a 4400 metros, onde há algumas construções abandonadas há décadas.

Em meio à neblina, foi procurar o começo da trilha do Maximo em outro vale. Encontrei um caminho razoável que nos leva até lá em 2.4km de trilha simples, melhor que os 4 desde um acampamento mais abaixo. A neblina e a lembrança de quem já foi, deu um clima fantasmagórico na montanha. Olhando todas estas ruínas e pensando que todo mundo que já trabalhou aqui está morto, aumentou este sentimento.

Acampamos dentro de uma antiga casa de pedra, que segundo me disseram, tinha cem anos. Montamos a barraca para não ser atropelados pelos ratos e fizemos um jantar acendendo a lareira de um dos quartos. Fomos dormir com chuva, acreditando que terminaria em breve, tendo como base pra isso a previsão Mountain Weather Forecast.

Como combinado, acordei às 2 da manhã. Haviam estrelas no céu, que desapareceram assim que chamei o Waldemar. Sem esperanças, voltei à barraca e foi chamado por meu parceiro que falou: _ É pouco provável que se você ficar sentado na beira da montanha, um pato assado entre na sua boca (provérbio chinês).

Até que a intenção foi boa, mas logo que esquentamos um chá, a chuva voltou. Esperamos um pouco e ela não se acalmou. Desistimos de ir ao cume.

Depois que o Waldemar voltou à sua barraca, reacendi a lareira com algumas brasas que ainda queimavam, e assisti por quase 2 horas as chamas consumirem a lenha, sozinho naquela escuridão ao som do tinlintar das gotas de água batendo na telha da velha casa. Talvez tivesse mais gente ali comigo...

Ao amanhecer vimos que a previsão da janela de tempo estava certa. O Famatina estava todo branco, mas já não havia tempo. Não adianta uma janela de tempo pela manhã se na madruga chove. A montanha se fechou novamente poucas horas depois.

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:: Veja o tracklog do Famatina no Rumos: Navegação em montanhas

Protesto contra a reativação da mina La Mejicana.

Caminho ao Famatina

Waldemar na porta de nosso "refugio".

Waldemar com espirito Inca.

Teleférico com tempo ruim.

Ouvindo o som da chuva e vendo o fogo na madrugada.

Teleférico com tempo bom, que durou pouco.

Famatina nevado.

Barro amarelo do rio Amarillo.

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