Blog do Pedro Hauck: De Salta a Cachi

11 de julho de 2007

De Salta a Cachi


Cachi (província de Salta), Argentina, 10 de julho de 2007

Por Marcio Carrilho

Promessa é dívida, eu sei, e não se preocupem que vou passar aqui um pouco do que o Pedro me ensinou sobre a araucária enquanto viajávamos pelas estradas do Paraná e de Santa Catarina. Mas, antes, farei um breve resumo do nosso dia de hoje.

O céu amanheceu lindo em Salta (1.187m), sem uma nuvem e muito azul – “despejado”, como se diz aqui. Visitamos pela manhã o Museu Arqueologico de Alta Montaña, que fica bem na praça central da cidade, a Nueve de Julio. Muito bacana e bem arrumado, o museu tem como ponto alto do seu acervo três múmias de crianças incas encontradas em urnas funerárias no topo do Llullaillaco, um vulcão adormecido de 6.739m, localizado na fronteira Chile-Argentina, na província de Salta - e que um dia a gente vai escalar, podem escrever. Os incas não eram alpinistas, como nosotros, mas curtiam umas oferendas a Pachamama (a Deusa Mãe da Terra) no topo das montanhas andinas, onde eventualmente também eram deixados corpos de filhos da nobreza – até porque é mais fácil carregar o corpinho de uma criança morro acima do que o corpão de um adulto.

Os incas podiam ser devotos, mas não eram bobos... Há registro de mais de 200 ruínas incas em alta montanha, muitas delas com múmias, desde o Equador até o Chile e Argentina, passando por Peru e Bolívia.Depois, já de carro, fomos ao Cerro San Bernardo (1.434m), ponto turístico de onde se descortina uma vista panorâmica de Salta – também acessível a pé, por uma trilha em escadas, ou por teleférico.

Saindo da cidade, passamos num hipermercado para comprar os mantimentos que levaremos para a montanha – aliás, para as montanhas, que as nossas pretensões são vastas, acreditem. Muita massa, sopas, molhos, atum, biscoito, enfim, essas coisas industrializadas e sem graça que se come quando se está acampado numa barraca apertada, com o nariz entupido e ressecado, enjoado, morrendo de frio e com dor de cabeça, a mais de quatro ou cinco mil metros de altitude, e ainda com um marmanjo fedorento ao seu lado padecendo dos mesmos males. Isso é conhecido aí no Brasil como “programa de índio”, e no Nordeste, mais espeficicamente, como “programa de corno”. Aqui, eu chamaria de “programa de inca”. Mas, vai entender a cabeça de quem é louco por montanha...

Rumo a Cachi, rodamos 160km por uma estrada muito bonita, parte asfaltada, parte de terra, que serpenteia por vales e depois sobe até 3.200m, já dentro do Parque Nacional Los Cardones. O visual lá em cima é lindo e inóspito, um planalto muito largo com florestas de cactos enormes, altos e cilíndricos, alguns com ramificações que parecem braços, que são os tais cardones que emprestam o nome ao parque, e morros dos dois lados, cujas cimas estavam iluminadas pelos últimos raios de sol de fim de tarde. Cachi, já fora do parque e a 2.350m (segundo o super GPS “McGiver” do Pedro – mamãe, eu quero um igual!), é pequena e charmosa, um vilarejo colonial perdido nos Andes com construções de mais de 200 anos, que lembram aquelas cidades mexicanas de filme de faroeste da Sessão da Tarde.

Estamos numa pousada bem confortável, El Cortijo (que de cortiço não tem nada, muito pelo contrário), e comemos muito bem no restaurante Luna Cautiva. Para completar, assistimos numa birosca à emocionante vitória do Brasil sobre o Uruguai na semifinal da Copa América, com todos os argentinos presentes secando a nossa Seleção. Pior para eles, que agora vão ter que passar pelo México se quiserem ter o prazer de jogar com a gente – e perder, claro, como há três anos.

Se passarem, menos mal, pois no próximo domingo, dia da final, já estaremos no Chile...ARAUCÁRIA, AFINAL!Agora sim, vamos falar um pouco da araucária brasileira (Araucaria angustipholia), esta simpática árvore tão característica do Sul do Brasil, especialmente do Estado do Paraná. Como o próprio nome indica, ela é uma espécie predominante no geossistema do Planalto das Araucárias, que vai do Rio Grande do Sul ao Paraná, passando por Santa Catarina. Além disso, ela também aparece em alguns redutos mais altos da região Sudeste, como nas serras da Mantiqueira (SP, MG, RJ) e Caparaó (MG, ES).Quando a gente vê aquela árvore estranha e imponente, que pode chegar a 40 metros de altura e viver por mais de 150 anos, com seus galhos lá no alto apontando para cima, como braços querendo segurar alguma coisa, nem imagina que trata-se de um verdadeiro dinossauro vegetal vivo.

Assim como as samambaias, a araucária tem a mesma cara há 200 milhões de anos! Ou seja, são tão antigas quanto os próprios dinossauros, pois surgiram no Triássico, (incrível é que o Pedro fala tudo isso assim, na maior naturalidade, como quem comenta o último jogo do Corinthians, time pelo qual torce, aliás – viram?, ele sabe muito, mas não é perfeito!). A araucária, assim como os pinheiros, seus primos modernos, são gimnospermas, ou seja, espécies vegetais (se eu disser “plantas” o professor me mata!) que pouco evoluíram desde o seu surgimento na superfície da Terra. Não lembram das aulas de biologia? Eu também não lembrava, então vamos lá, tecla SAP: gemnospermas são plantas (agora foi...) sem fruto, o que indica que têm um sistema reprodutivo mais simples, porém extremamente eficaz para a sua perpetuação.

Tanto isso é verdade que a araucária está aí há 200 milhões de anos, e com pouquíssimas adaptações evolutivas até aqui. Além da brasileira, há espécies de araucária no sul do Chile e Argentina (Araucaria araucana), na região dos lagos e vulcões, próximo a Temuco, no Chile, e San Martín de Los Andes, na província de Neuquén, ao norte de Bariloche, no lado argentino. Inclusive os índios chilenos desta região são conhecidos como Araucanos.

Assim como a sua prima brasileira, a madeira desta araucária é excelente para a produção de móveis e acabamento em construções, sendo considerada de lei.As outras duas espécies conhecidas de araucária (bem, pelo menos as que o nosso oráculo aqui ao lado conhece, então eu duvido que haja outras), são da Austrália, sendo que na praça central de Salta, a já citada Nueve de Julio, há alguns exemplares de uma delas, a Araucaria bedwillii – a outra chama-se Araucaria columnaris. Além de ser muito bonita e oferecer ótima madeira, a araucária também é fonte de alimento. Sua semente, o pinhão, é bastante apreciada nas regiões onde ocorre, podendo ser cozida e comida pura ou na preparação de pratos.Gostaram? Bueno, entonces después a gente fala do Chaco.

:: Continue lendo esta história

Araucária Australiana na praca central de Salta

Comeco da estrada para a Cachi, em um lugar chamado Cuesta del Obispo, onde comeca a subida da cordilheira

Cactos Cardones, numa vertente na beira da estrada na Cuesta del Obispo.

Aspecto do interior do Parque Nacional Los Cardones, numa altitude de 3300 metros, ponto culminante da estrada Salta - Cachi.

Construcao no centro de Cachi, arquitura parecida com a do ¨Faroeste¨ do Mexico

Restaurante Luna Cautiva, boa refeicao!

:: Continue lendo esta história

Um comentário:

Anônimo disse...

como está a bóia por aí? Muita pimenta? Hummmm eo cafezito?
Ari Hauck