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Foi com terremoto de 6.3 graus na escalada Richter que fomos dormir no dia 25 de setembro. Seria um bom sinal? Pelo menos a angustia pela espera do conserto do Conway havia acabado e poderíamos sair de Chilecito para o começo de nosso real projeto: Escalar montanhas sem nome e sem registro de ascensão.
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Foi com terremoto de 6.3 graus na escalada Richter que fomos dormir no dia 25 de setembro. Seria um bom sinal? Pelo menos a angustia pela espera do conserto do Conway havia acabado e poderíamos sair de Chilecito para o começo de nosso real projeto: Escalar montanhas sem nome e sem registro de ascensão.
O despertador tocou muito por volta das 5 da manhã e deixamos a cidade ainda no escuro para a atravessar a “Cuesta Miranda”, que é a estrada que liga as cidades de Nonogasta à Villa Unión antes das 7, pois a partir deste horário ela fecha e só é possível cruzar após as 19. Obras eternas que parecem estar acabando.
Atravessamos Villa Unión com a cidade deserta e tomamos o caminho da RP76 que leva até a fronteira com o Chile pelo Paso não habilitado de Pircas Negras. Passamos por outras cidades no caminho, como Villa Casteli, Vinchina, onde abastecemos e Alto Jague para enfim chegar na estrada de terra deste remoto passo andino.
Estávamos ganhando tempo, dirigindo com cuidado, mas não deixando de prestar atenção na paisagem deslumbrante. Cruzamos um passo, com bastante neve acumulada na estrada e logo demos de cara com as montanhas de 6 mil da Província de La Rioja: Bonete Chico, Veladero, Baboso e atrás, o complexo do Penãs Blancas e o Pissis. Diante de nós estava “somente” a terceira e a quarta montanha mais alta de todo continente.
Num determinando momento saímos da estramos principal e derivamos ao Sul andando por uma planície com bom substrato: _ A trilha deve estar aí em frente! Dizia Maximo, que não desgrudava o olho do GPS e da navegação.
E de fato estava, encontramos um caminho 4x4 bom e seguimos por ele, tomando cuidado para desviar da neve acumulada, que podia atolar o Conway. Em um deste desvios, acabei passando em cima de uma pedra com as rodas da direita e senti um impacto. Minha barriga gelou e achei melhor sair para “tirar água do joelho”. Nessa sem surpreender-me percebo que meu pneu estava totalmente murcho. A barriga gelou ainda mais.
Neste momento tive certeza que deveria voltar e reparar o pneu, pois não estou levando dois steps. Trocamos as rodas com facilidade e voltamos pelo mesmo caminho da ida. Neste momento você pensa em tudo. Já havíamos passado por uma grande dificuldade com o carro quebrado. Não queria passar por um problema semelhante novamente.
Voltando o caminho entramos em Jague. A cidade estava morta, avistamos apenas uma pessoa na rua e fomos perguntar se ela conhecia um borracheiro. Com um sotaque quase incompreensível ela nos disse que não. Insistindo, dirigimos pela única rua da cidade a procura de outra pessoa, mas não havia ninguém, nem na delegacia de Polícia.
Decidimos retornar mais 25 km até Vinchina e ao chegar lá a única borracharia estava fechada. Pelo menos a cidade não estava tão morta e um senhor sentado em frente de sua casa nos avisou o borracheiro, que foi abrir o negócio para arrumar nosso pneu, que tinha feito um rasgo.
Consertado o problema, não tive coragem de rodar com o antigo pneu e subi a cordilheira novamente, até chegar no Refúgio El Peñon, construído em 1873 era um abrigo aos boiadeiros que levavam gado ao Chile. Dormimos lá dentro e ainda pudemos assistir um filme. Luxo total. Ainda mais com a luz da lua cheia que iluminou a noite num espetáculo lindo de ver.
Aniversário com Perrengue
No dia 27 acordamos sem pressa. Era meu aniversário de 34 anos! Apesar da data, não comemorei, pois estava preocupado com o itinerário.
Deixamos o refúgio e pegamos o mesmo caminho do dia anterior, alcançando em calma o trecho onde o pneu furou e adentrando a Puna do Atacama e seu vazio. Este é um dos lugares mais remotos da América do Sul. Belo e assustador. Não é um local onde deseja ter um problema com o carro. Por isso fui bastante cuidadoso.
Por sorte o caminho estava bom. Fui abusando até chegar numa descida com um neveiro grande. Como era um vale, decidi arriscar e o carro atolou na neve. Infelizmente havia uma capa dura de gelo, mas embaixo era puro pó. Frio da na barriga.
Cada tentativa de tirar o carro a coisa piorava, a roda cavava mais e mais o gelo. Eu sei que ali não é um lugar para estar em um único carro, mas não tivemos opção. Apesar da situação nada agradável, não desanimei e tentamos solucionar o problema.
Com uma pá plegável cavamos o gelo e fomos calçando os buracos com pedra. Para agilizar, Maximo e Suzie usaram uma lona que uso para colocar minha corda de escalada. Enchiam de pedra e traziam para calçar o gelo. Depois de diversas tentativas conseguimos tirar o conway da gelada e desviei o caminho pelo meio da encosta.
A trilha continuou sem percalços, até chegarmos num lago de agua salgada, onde em sua borda havia pedras organizadas de forma retangular. Paramos para ver e percebemos que era uma plataforma de pedras em ruinas. Levando em consideração o tipo de trabalho e a proximidade com o lago, acreditamos ser ruinas Incas.
A trilha continuou por mais tempo, cruzando o meio do nada, até que de repente chegamos num caminho bem feito, aplainado por uma moto niveladora. Era nosso caminho e achamos ser um trabalho de uma antiga mineradora.
Continuamos o bom caminho até descer uma vertente que levava até um rio. Eu neste momento suspeitava que havia algo de errado, pois lembrei de ter visto no mapa um lugar ao lado de um rio chamado “Pto. Majadita, no les deja passar”. No momento do planejamento parecia insano haver um lugar no meio do nada com algum tipo de controle. Que corno estaria ali no meio do nada?
Aproximando das construção vejo um cartaz “Control 100 metros” e depois “Parque Nacional San Guillermo”. Passo devagar e procuro por algum ser humano. Ninguém apareceu e a porteira estava aberta. Continuei devagar e fui embora. Claro, que o coração na mão por estar fazendo algo “errado”. Será?
O caminho era realmente bom e não tive dificuldades. Maximo, que estudara o caminho, falou que iriamos passar por um lugar humano, possivelmente uma mineradora abandonada e de fato, após fazer uma curva ela apareceu, chama-se La Brea. Fomos novamente bem devagar, esperando que alguém saísse de alguma construção, mas nada aconteceu e continuamos.
Depois de La Brea começa uma subida forte. Tive que acionar a reduzida, mas eis que o que já estava difícil fica ainda mais com um trecho cheio de neve na estrada. Tenho que embalar e mandar uma roda sobre a terra e outra sobre o gelo. Mas a terra está molhada pelo degelo e afundo na lama.
Acabo por voltar e pouco a pouco vou compactando um caminho com as rodas e consigo passar por este trecho perrengoso. No entanto a dificuldade não acabou ali e pouco depois chegamos num lugar ainda mais íngreme com mais rocha e mais lama.
Tento diversas vezes fazer a mesma coisa que no local anterior, mas não consigo. O carro perde tração e atolo na lama gelada. No entanto, percebo um antigo caminho pela esquerda em zig zag que deveria ser uma estrada mais antiga. Indo e voltando com bastante embalo consigo estrar nesta estrada antiga e assim vencemos este obstáculo.
Ainda tivemos dificuldade em outra subida com gelo acumulado, para enfim chegar num ponto sem saída, ali a estrada era totalmente coberta pelo gelo e não tinha mais saída. Ainda caminhamos buscando uma solução, mas nada!
Como ali estava a 4100 metros e estávamos a apenas 6 km de um cume sem nome, decidimos acampar ali mesmo, usando o Conway como barreira de vento. Montamos as barracas na estrada e fomos dormir com um plano desenhado de escalar aquela montanha, que por um motivo obvio de toponímia, batizamos temporariamente de “La Brea”, com 5225 metros de altitude.
Antes de jantar ganhei meu presente de aniversário. Pude ligar para a Maria Tereza e matar saudades por 2:26 minutos. Foi ótimo ouvir sua voz. Antes de dormir, quando a natureza nos brindou com mais uma noite de lua cheia, assistimos um filme bobo no computador da Suzie, e isso foi ótimo para pegar no sono.
O que será de amanhã? Eu não sei? Será que alguém vai subir aqui pra multar a gente, será que fazemos o cume e voltamos com tudo ok? Vamos ver!
:: Continua...
:: Continua...
Subindo até Laguna Brava |
Vendo o Bonete Chico, quarta montanha mais alta dos Andes. |
Uma bela dobra do tipo chevron ao lado da PR 76 em La Rioja |
Refúgio El Peñon construído em 1873. |
Refúgio El Peñon à noite. |
Atolando o Conway na neve. |
Provável ruína inca ao lado de lago no meio da Puna. |
Lago com água salgada no meio do nada. |
Meio do nada |
Fim da linha, gelo na estrada impediu de seguirmos. |
Acampamento no meio da estrada. |