Blog do Pedro Hauck: Floresta Nacional do Tapajós

18 de janeiro de 2011

Floresta Nacional do Tapajós

A Floresta Nacional (Flona) do Tapajós é uma unidade de conservação localizada ao Sul de Santarém que mantém original alguns ecossistemas da Floresta Amazônica.

Para chegar lá há duas maneira. A primeira é de ônibus, que parte todas de Santarém todos os dias úteis e que chega até a comunidade de Jamaraquá. Outra é por barco no rio Tapajós. Não existe barcos comerciais que vão até lá, mas alguns moradores que oferecem serviços aos visitantes podem te levar. Eu fui no barco do Sr. Iracildo, que nos ofereceu além do transporte, um canto na sua casa e refeições num preço bem amigo, além de passeios na Floresta que vou comentar aqui.
Casa do Iracildo

Visita curiosa na hora do almoço

Casas em Jamaraquá

Há diversas trilhas na mata. Por conta do tempo, não pude conhecer todas, mas a trilha que eu fiz deu pra sentir um pouco do que são os ecossistemas amazônicos. Como meu grupo era grande, fui acompanhado de dois guias, o Luis e a Lourdes, que me passaram todas as informações que vou escrever aqui, que completei um pouco com o minhas interpretações.

Pude perceber e conhecer 3 ecossistemas. São dois em terra firme e um em áreas alagadas, o Igapó. Os ecossistemas de terra firme se diferenciam apenas pelo solo. Enquanto um dos ecossistemas fica nas proximidades do rio e por isso ali existe um solo arenoso pouco evoluído, (neossolo quartzarênico), o outro situado em um planalto a 100 metros de altitude é composto por solos mais evoluídos, porém assentados sobre terrenos lateríticos, ou seja, sobre jazidas de ferro que evoluíram ao longo de milhares de anos com a estabilidade de um clima tropical semi úmido. Embora mais profundos, há uma concentração de ferro e de alumínio muito grande neste solo e isso faz dele pouco fértil.

Sob um clima atualmente muito úmido, há condições fisiográficas para dar suporte à uma floresta, mas devido à diferenciação dos solos, a floresta que eu chamo aqui de mata de areia, situada mais próxima ao rio, apresenta um grau de sucessão intermediário, com árvores mais baixas, muitas delas pioneiras,. Devido seu porte mais reduzido, elas deixam passar mais raios solares, permitindo a existência de muitos cipós que formam um emaranhado de plantas que dificultaria a penetração, se não existissem trilhas na região.


 Floresta de areia, veja as Palmeiras no sub bosque
Floresta do vale fluvial abaixo visto deste o planalto da floresta de terras altas.

Solo arenoso com matéria orgânica na superfície

Clareira aberta por queda de árvore

Mesmo sobre solos mais empobrecidos, existem muitas espécies clímax nesta floresta, espécies mais altas de crecimento lento que são aquelas que indicam um grau mais evoluído da mata.  Ali na mata de areia, porém, elas ocorrem com porte reduzido. Estas árvores são: Jatobá, Marupá, Morototó, Samaúma. Esta floresta apresenta uma fisionomia semelhante à uma floresta estacional, mas mesmo assim ocorrem espécies de sub bosque, que muitas vezes tem o mesmo porte das árvores clímax, que dominam o dossel da floresta.

É muito comum a presença do Curuá, palmeira que tem muita serventia às populações tradicionais, pois fornece a palha para o telhado das construções. Por se tratar de uma palmeira abundante, eles nunca ficam sem matéria prima para suas casas. Outra Palmeira muito comum é o Tucum Açu, que é batante espinhento. Esta Palmeira fornece um fruto muito apreciado pelo homem amazônico, o Tucumã, de gosto amargo. Quando este fruto apodrece no chão da floresta, cresce dentro de seu caroço um verme, o Gongo, que serve de remédio para combater Hérnia.

Há outras plantas com propriedades medicionais e outras utilidades, como o Breu Branco, que quando tem sua casca arrancada, aflora uma espécie de seiva branca que dá nome à árvore. Quando esta seiva é queimada, sua fumaça, bastante aromática, serve para desobstruir vias aéreas. É muito gostoso. Além dela, há também a Jutaia, que tem madeira com alto poder calorífico que quando queimada dá chama azul.

Os Cipós amarram todas as árvores, fazendo com que se uma cai, várias outras caiam juntas, abrindo uma clareira que permite a propagação de espécies que gostam de claridade. Os mais comuns são o Cipó Cuia de Macaco, Escada de Jaboti e o Cipó Taracoá, que tem múltiplas finalidades. A primeira é na construção, pois ele é fino e resistente e serve para amarrar a palha usada nos telhados. Além disso, ele tem propriedades medicinais, atuando para combater dor de barriga.

Interessante notar que toda esta floresta se desenvolve sobre o solo arenoso, um solo muito permeável. Toda a água da chuva que cai ali escoa rapidamente pelo solo, deixando a superfície seca e favorecendo árvores com raízes profundas, como aquelas do cerrado. É um solo empobrecido, pois a água lixívia todos os nutrientes rápidamente. Porém a floresta serve este solo com muita matéria orgânica proveniente do apodrecimento das folhas que o mantém revitalizado. Porém basta o homem retirar esta floresta para romper o equilíbrio. O resultado disso seria a formação de voçorocas e dificuldade para as árvores se recomporem.

Após caminhar por esta planície fluvial, subimos cerca de 80 metros até chegar ao planalto onde fica o segundo ecossistema florestal de terra firme. Lá as árvores são muito maiores, mesmo aquelas que também ocorrem nos terrenos arenosos. É o caso da Samaúma, que tem um  indivíduo com mais de 40 metros de altura. O Cajá, o Amarelão, Amapá, Piquiá, Carapanaíba, Fava Bolacha, Sacacá e outras. Algumas dessas árvores têm propriedades medicinais, como Piquiá tem um fruto comestível, de onde se extrai um óleo bom para infecção e cicatrização. A casca da Carapanaíba ajuda a combater os sintomas da Malária

Claro que um ecossistema florestal com o porte tão elevado como esta floresta apresenta em seu sub bosque várias espécies de sombra, muitas delas com propriedades bem interessantes, como o Cacau Jacaré (com flor muito bela), a Pitomba, Cacau da Floresta, Cipó Alho, Taperebá, Cumaru (bom pra Diabetes e tosse), Louro Rosa (que mantém substância aromática muito agradável), Cipó Amber e o Sacacá (que de sua casca faz-se um pozinho que é usado para combater cárie).

Além das plantas com propriedades, há também insetos, como a formiga Taxí. Esta formiga constrói seu formigueiro no tronco das árvores e dos cipós. Elas servem de repelente, mas para isso você tem que ser rápido, deixar elas irem a suas mãos e esmagá-las antes que te piquem.

Tirando a seiva do Breu Branco

Queimando o Breu Branco

Palha do Curuá

Tucum Açu

Samaúma gigante

Diferença de tecnologias

Fruto de Piquiá

Carapanaíba

Formigueiro de Taxí

 Palha de Curuá amarrado com Cipó Taracoá

Tudo isso aprendi com meus guias. Eles não fizeram faculdade, não tem títulos e nem educação formal. Aprenderam tudo o que sabem com seus pais e os mais velhos, é o famoso conhecimento popular, cada vez mais perdido por conta da educação formal das escolas, pelo desinteresse dos jovens e da moda ditada pela televisão.
Ainda bem que em Jamaraquá este conhecimento se mantém e esta população se beneficia disso, seja por conta das ervas medicinais de suas farmácias (a floresta) ou de outras coisas. Lá em Jamaraquá tudo vem da mata, desde a palha usada nos telhados das casas (o Curuá) ou a madeira usada na fabricação dos barcos (Taúba, no casco e Cedro no assoalho), impressionante! Os povos da Floresta são muito mais inteligentes que as pessoas das cidades, mesmo vivendo de forma mais simples e sem acesso a muitas facilidades da vida moderna, ainda bem, graças a eles a cultura popular original dos povos amazônicos é mantida, cultura que precisamos aprender mais.
Bom, faltou falar da mata de Igapó, não é? Bom, continuo na próxima....

Um comentário:

Cris Batista disse...

Necessário comentar que todas as visitas devem ser autorizadas pelo ICMBio, órgão federal, gestor da Floresta Nacional do Tapajós. Turistas pagam uma taxa de visitação diária, hoje R$5,50, regulamentada por portarias do MMA e ICMBio. As custas de serviços turísticos dos comunitários são independentes da taxa do ICMBio. Para visitar a unidade, dirija-se a uma das bases do ICMBio e se identifique. Se for de barco, deve parar na Base da comunidade de São Domingos!!