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Debaixo do manto negro da noite com lua minguante, um barulhinho quase inaudível interrompe o silencio da fria montanha. Se não estivéssemos numa altitude tão elevada, 5320 metros, duvido que eu acordaria.
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_ Vini, veja se são mesmo 4 da manhã. Falei para meu companheiro.
_ Deixa eu ver. Sim, é mesmo, vamos acordar...
Gritando para a barraca ao lado aviso do horário combinado e em alguns minutos Greissy e Paulinha se espremem dentro da bagunçada barraca para tomar um café da manhã composto de bolacha de maisena e um café de sache feito de figo torrado.
_ Mas que merda! Que café é esse? Diz o mineiro Vini ao ser surpreso pelo fato que na Argentina café é qualquer coisa que não café.
Eu me pego imaginando pra que serve esse tal de Mercosul se nem brasileiros conseguem ter acesso ao melhor que produz a Argentina e nem os argentinos ter acesso ao melhor que produz o Brasil.
Com pressa, deixo meus pensamentos voarem com o vento e já com toda a indumentária de montanha partimos no escuro deixando o barulho do pano das barracas sacudidas pelo vento para trás.
Subimos uma vertente pouco íngreme e logo temos que descer para um vale seco e ganhar altura em outra mais abrupta que nos protege do vento congelante. Ali, já com o lusco fusco do nascer do sol fazemos nossa primeira parada para hidratar e ver como estão todos. Que apesar do frio estão bem.
Vencemos esta vertente íngreme e caímos no outro lado num anfiteatro com um laguinho de cor celeste. Atravessamos rapidamente a breve planície e logo estamos galgando a crista que leva até o cume do “pequeno Baboso”, este 6 mil andino pouquíssimo frequentado e conhecido que tem apenas 8 metros a menos que o badalado Huayna Potosi da Bolívia.
Logo que montamos na crista somos açoitados pelo vento impiedoso que nos castiga com suas geladas rajadas. Para nos proteger, andamos fora da charneira pelas orilhas do espigão, de forma que a própria crista nos protegesse. No entanto a estratégia não dá certo todo o tempo, pois vira e volta grandes blocos rochosos nos força a seguir pelo outro lado, onde novamente sofremos com as rajadas.
Com o sol nascendo percebo que esqueci meus óculos e a Greissy, que carregava uma viseira de ski me empresta seu Julbo com aro cor branca. O que já rendeu comentários que eu estava “fashion”. Na moda ou não conseguimos resolver este problema pontual e proteger minha visão da reflexão dos raios solares na neve.
A ascensão foi então a repetição de cenas da gente tentando nos proteger do vento e ganhando altura pela face protegida da crista. Pouco sentimos o cansaço e a altitude, o que nos mostrou o quanto nossa aclimatação foi bem sucedida. A crista, que é a única feição de relevo a ser vencido até a cúspide da montanha foi ficando menor diante de nós, até o ponto que apenas pequenas elevações rochosas nos limitava ao ponto mais alto e nada mais havia para subir.
No cume achamos um monte de pedras empilhadas que seguravam uma garrafa que era o “livro de cume”, o qual nem assinamos, devido ao êxtase da vista. Dali foi possível ver o Bonete Chico, a quarta montanha mais alta dos Andes e nosso próximo desafio, o Pissis, a terceira e muito perto a montanha que foi o pano de fundo de toda a ascensão, o Veladero. Além deles, vimos também o Nevado Famatina, o Conjunto dos Três Cruces e o Vulcão Reclus, logo ao norte. Também pude identificar dentro das várias montanhas, o Vulcão Parofes, que conquistamos recentemente.
Fizemos um descenso tranquilo até o acampamento, aonde chegamos cedo para comemorar e descansar. Passamos o resto do dia comendo e quase dormindo, até a noite chegar.
Pelo Telefone satelital, recebi a previsão e notei que o vento iria aumentar e reduzir nossa chance de sucesso no Veladero, montanha que literalmente estávamos na boca do gol.
Após 8 dias em altitude, decidimos antecipar a descida à Vinchina para descansar e retornar com tudo para escalar o Bonete Chico e o Veladero. Decisão acertadíssima, já que após o dia que descemos o tempo fechou e nós pudemos ter dois dias de bastante paz, antes de regressar à altitude.
:: Continua...
:: Continua...
A crista do Cerro Baboso |
Galgando a crista pela manhã. |
Vini e ao fundo o Cerro Veladero |
Nuvens indicam que o tempo iria mudar. |
No cume com o Bonete Chico ao fundo. |
Vista para todas as montanhas da Puna da Corona del Inca desde o cume do Baboso