Após uma noite com sono estranho, acordei cansado e não levei muito tempo em colocar a barraca e tudo mais dentro da minha mochila e começar a partir. Fui com o Jovani pelo mesmo caminho que a ida, apenas cuidando mais para não precisar atravessar os vales que dissecavam a vertente do cordão de montanhas que se alinhavam do Pissis ao Nacimiento Del Jague, vertente essa que tínhamos que costear logo após vencer o passo que cruzava o portesuelo destas montanhas.
Ainda que caminhando lentamente pelo cansaço acumulado destes 2 meses, fomos ganhando terreno com rapidez e logo que notamos já estávamos no vale mais profundo, que foi o primeiro da ida, cujo qual foi a maior dificuldade do começo da aproximação. Novamente costeando com cuidado e tomando atenção para não resbalar no gelo, vencemos este desafio e fomos parar no alto do vale que ia direto ao acampamento “Mar Del Plata”. Cujo caminho tive muitas dúvidas se estava correto ou não, pois o GPS estava sem pilha e a vota é sempre diferente da ida.
Minhas duvidas, no entanto, se solucionaram quando, dobrando numa curva do vale, encontro Maximo mexendo o Troller do Jovani. Cabeçudo como sempre, Maximo quis explorar outro vale (o que está referenciado no site Rumos) e ele chegou antes da gente.
Ao acercar, ele se assusta com a surpresa da nossa chegada e nos dá boas noticias. Finalmente boas depois de tanto perrengue. Ele diz que mais abaixo está o Jonson Reynoso com Rubem Barrera, um dos donos das caminhonetes abandonadas e a montanhismo Colo, de Mendoza, junto com ele.
Apenas para situar os ocorridos, havia no acampamento, ao lado de nosso carro, duas caminhonetes Hilux que estavam abandonadas lá desde 25 de Março de 2015, quando houve uma grande tormenta de neve que impossibilitou os donos de sair dali dirigindo. Um deles, o Rubem, estava ali resgatando seu carro. O outro, o professor da escola de guias de montanha de Mendoza, Marcelo Acosta, morreu antes disso acontecer.
Foi uma epopeia que eles viveram. Eram 10 pessoas que tiveram que sair dali caminhando com neve na cintura. Levaram 5 dias para fazer 70 km e foram resgatados por um helicóptero. Durante todo este tempo Marcelo não tinha informações sobre seu carro. Em Setembro, outro carro que estava nesta situação, o da inglesa Marion Brown, ficou destruído pelos ventos, sem vidros e com pintura fosca.
Por sorte, as caminhonetes ali ficaram protegidas do vento e nada demais aconteceu com elas, mas mesmo assim tinha muita dificuldade em dar a partida nelas e por que não dizer, também no Troller, que ficou por lá 2 noites.
Após muita tentativa, conseguimos dar partida nas caminhonetes, mas o diesel no tanque virou um gel e ele não queimava. Então começou a segunda odisseia, tirar os carros dali.
Fizemos uma chupeta no Troler e demos a partida. Já estávamos com a Hilux do Jonson, então decidimos rebocar as caminhonetes, o que foi um pouco difícil. Mesmo assim andamos uns 15 km, até chegar perto de um lago onde começamos a fazer gambiarras para tirar os carros de lá dirigindo.
Como o problema era o diesel no tanque, improvisamos um segundo tanque de diesel com bidões de combustível que colocamos no tanque. Demoramos cerca de uma hora em fazer um sistema que tirava o diesel do tanque e levava ao motor com mangueiras de jardim. Deu certo!
Eu fui no carro com Rubem Barrera e Jonson foi dirigindo o carro do falecido Acosta, dirigindo, diga-se de passagem, no cacete. Enquanto isso Rubem ia devagar, pois cada loma na estrada fazia que perdesse combustível que caía no parabrisa.
Não foi nada fácil dirigir naquela condição, ainda mais que era necessário passar por lugares que estava interrompido com neve e que foi necessário muita perícia na direção e muito stress. Mal acreditei quando conseguimos passar pelo ultimo lugar que tinha gelo.
Com missão cumprida, fui para o banco de passageiros do jipe do Jovani e com um piloto bem experiente, acabamos finalizando o resto do caminho 4x4 com bastante rapidez e chegamos em Fiambalá por volta das 10 da noite, a tempo de comer qualquer coisa e ir dormir no camping Paraíso, dormir profundamente sabendo que havíamos escalado a montanha virgem mais alta dos Andes.
No dia seguinte começou nossa epopeia de retorno ao Brasil. Infelizmente meu ar condicionado parou de funcionar, mas ainda bem conseguimos cruzar o norte da Argentina. No mesmo dia passamos por Catamarca e subimos uma serra na frente da Capital que é muito bonita, andando por estrada de terra e chegando a Santiago Del Estero, onde fomos dormir.
No outro dia chegamos até Ituzaingo, ao lado do rio Paraná e de lá chegamos tarde da noite em Curitiba, para ver minha querida Maria depois de 2 meses ausente, que saudades!
Pensando sobre a expedição
Eu tinha muitas expectativas sobre esta expedição. Achei que pelo tempo disponível eu poderia escalar muito mais, fazer umas 10 montanhas de 5 mil metros virgens e ainda chegar no meu 6 mil metros de número 40.
Infelizmente não foi possível fazer tudo isso. O clima foi impiedoso, com muito frio e imprevistos. A fronteira fechada impediu que fossemos e voltássemos e no final fiz menos que podia e passei muitas dificuldades. Pra começar todo o tempo esperando arrumar o carro porque o anti congelante congelou, depois as incertezas do tempo ruim com frio e vento. Sem falar a saudades da Maria. Não é fácil ficar distante.
Mesmo assim fizemos 8 montanhas de 5 mil metros, das quais tenho certeza que no mínimo 2 receberam a primeira ascensão e outras tantas a primeira ascensão depois dos incas. Além disso fiz mais 4 montanhas de 6 mil metros, das quais 3 foram primeiras ascensões brasileiras e uma delas foi a segunda ascensão absoluta, que foi no Sierra Nevada. Além disso, a conquista do Vulcão Parofes foi simplesmente a ascensão da montanha virgem mais alta dos Andes.
Então acredito que apesar de todo o sofrimento foi uma viagem que esportivamente valeu muito a pena, mas mal deu tempo de ficar um pouco em casa e curtir a mulher e meu negócio na loja AltaMontanha. Mal tive tempo de escrever aqui estas experiências e cá estou nos Andes outra vez.
Escrevo este texto, finalizando esta experiência no que chamei de “Expedição Exploratória Montanhas dos Incas” e já começo outra, a “Expedição Corona del Inca”, que não é mais uma expedição exploratória, embora tal lugar seja muito pouco explorado.
Não sabe o que é a Corona Del Inca e onde fica? Fique ligado aqui e verá....
Gambiarra na caminhonete do Rubem Barrera. Tanque de combustível no capô. |
As duas caminhonetes que foram resgatadas. |
Fim de expedição no camping Paraíso. |