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Deslizando suavemente sobre a areia, o jipe vai ganhando altura num vasto planalto vulcânico. Estamos na Cordilheira Ocidental, próximo à fronteira com o Chile. Aqui as montanhas são vulcões, o clima é mais seco, venta mais e castiga muito mais. Trata-se de uma região elevada reconhecida como Puna do Atacama que vai do Norte da Argentina até esta região da Bolívia.
Deslizando suavemente sobre a areia, o jipe vai ganhando altura num vasto planalto vulcânico. Estamos na Cordilheira Ocidental, próximo à fronteira com o Chile. Aqui as montanhas são vulcões, o clima é mais seco, venta mais e castiga muito mais. Trata-se de uma região elevada reconhecida como Puna do Atacama que vai do Norte da Argentina até esta região da Bolívia.
A paisagem é desoladora, mas ao mesmo tempo encantadora. Mesmo tão hostil há gente vivendo em qualquer lugar, quase sempre se dedicando à pastagem da Lhama, um dos poucos animais domesticáveis que vivem bem aqui em cima.
Já estive aqui antes 3 ocasiões, na primeira foi quando eu e o Maximo escalamos o Pomerape, o mais meridional dos vulcões gêmeos chamados de Payachatas em 2002, quando eu tinha somente 21 anos. Fizemos esse recorrido à pé e em 2 dias. Na segunda vez foi em 2007, quando escalei o Parinacota, o setentrional destes belos e grandes vulcões. Fiz a ida a pé, levando o peso num burro e volta de carona num jipe, quando fiquei admirado que carros podiam chegar ali. Na terceira vez, a bordo da minha antiga Ecosport, fui até onde começam os areais e voltei com muito medo de atolar. Agora no jipe tudo parece muito fácil.
Deixei o Maximo sozinho na base do Parinacota. Esta é a única montanha de 6 mil metros da região que ele ainda não escalou. Após um rápido desejo de boa sorte volto pela trilha 4x4 que me conduziu tantas vezes por aquele local e vou para outra montanha que eu nunca havia estado, o Acotango.
Saindo de Villa Sajama, tomo a estradinha poeirenta que leva até a fronteira com o Chile e um pouco antes de Tambo Quemado, aduana boliviana, pego outra estrada de terra que vai até um lugar chamado Chachacomani (nada a ver com a montanha). Nem chego ao local para ver o que se trata. Antes, começo a subir uma estradinha particular de uma empresa mineradora e começo ganhar altura por ela.
No começo a paisagem é do altiplano, com suas estepes secas. Ao subir um vale, passo por uma região recoberta por uma floresta anã de árvores de altitude que tem seus troncos e galhos retorcidos chamados de Keñuas que me acompanha até desaparecer na altitude. A estrada é supreendentemente boa, sinal que a mineração está rendendo bem. Passo pelo local onde o Maximo acampou e atacou o cume no ano passado e continuo subindo pela estradinha até o local onde meu parceiro georreferenciou como sendo um bom local para deixar o carro e começar um ataque ao Acotango. Diferente das imagens do Google Earth, a estrada continuava montanha acima e mesmo com certo receio prossigo.
A altitude já ultrapassara 5400 metros e o carro começa a perder a força a ponto que subir uma rampa leve, é necessário engatar a reduzida e ir em primeira galgando metro por metro na estradinha. Em certo momento, o caminho se divide. Opto pela esquerda e chego ao fim de um caminho em um barranco de rocha amarela e cheiro sufuroso. A mina é enxofre e o minério abunda de tanta maneira que a extração só necessita de uma boa estrada, um caminho e peões com pá.
Decido voltar e pegar o caminho da direita. Lá ganho um pouco mais altura e chego num local com visão privilegiada para os Payachatas, o lago Chungara e o cume do Acotango que aparentava estar incrivelmente próximo. Vejo a altitude no GPS e não acredito no que vejo: 5642 metros, nunca cheguei tão alto num carro!
O sol já começava a se pôr. Dentro do carro, rebato um dos bancos e vou ajeitando a bagagem, quando vejo estou deitado como se fosse uma cama e ao meu lado, a caixa de comida virou uma mesa. O banquete foi água com bolacha e doce de leite argentino.
Dormi muito mal por conta da altitude, apesar de todo meu conforto. Decido não sair muito cedo por causa do frio. De madrugada, minha respiração condensou e congelou dentro do carro, que ficou todo branco por dentro.
Nos primeiros raios de sol eu já estava aquecendo água no fogareiro para fazer meu café, dentro do carro obviamente. Com o espaço reduzido fiquei bastante atrapalhado e demoro a me aprontar, começando a dar os primeiros passos no dia apenas às 7:20 da manhã, tarde!
Mesmo assim o calor do sol vai me aquecendo e animando, os passos lentos são contínuos e vou ganhando terrenos rapidamente. Como a montanha é bem acessível, há trilha e por isso não preciso perder tempo interpretando um caminho de subida.
Após certo tempo o terreno rochoso dá espaço ao gelo, por sorte, gelo em boa qualidade, mas que em certos locais começa a dar amostra daquilo que vai virar nos próximos anos: penitentes.
Com os crampons nos pés, vou subindo com agilidade e quando menos percebo, depois de apenas 2:20 hs de caminhada, já estou no topo com uma visão privilegiada das montanhas visinhas, o Kapurata e o Guallatiri que é um vulcão bastante ativo cheio de fumarola. Neste momento passo um rádio ao meu parceiro que está no Parinacota e ele dá a noticia que também chegou ao cume. Fizemos o topo quase que simultaneamente.
No cume encontro o livro do Banco do Chile, que está no topo de todos os 6 mil chilenos e dou meu rápido depoimento. Filmo, fotografo e deixo as cinzas do Parofes, é hora de descer.
Chego ao carro relativamente rápido e eles nem está mais congelado. Arranco dali sem pressa e faço todo o caminho de volta para buscar o Maximo na base do Parinacota que quando cheguei, ele já me esperava.
Na volta em Vila Sajama acabo encontrando sem querer o experiente escalador curitibano Formiga, que hoje mora na Chapada Diamantina e que está na Bolívia para escalar o Sajama, dando inicio a um novo projeto de escalar montanhas. Passamos a tarde com ele e seus amigos jogando conversa fora. Foi muito bom depois de tanto tempo sozinhos encontrar gente com a mesma afinidade. Passamos várias dicas para eles fazerem a montanha e depois partimos para nossos desafios, que na verdade eram mais meus: escalar o Guallatiri e Kapurata, montanha que o Max já tinha escalado e que iria fazer sozinho.
:: continua...
:: continua...
Parte boa do caminho até o Parinacota |
Estrada para o Acotango |
Chegando ao local onde deixei o carro. |
Recorde de altitude com um carro: 5643 metros! |
local onde passei a noite |
Crista até o cume do Acotango |
Os Payachatas pela manhã. |
Caminho fácil |
Crista com gelo bom |
Vista para o Kapurata |
Registro no cume |
Parofito e a Lhama no caderno de cume. |
Caderno de cume. |
Apacheta destruída no cume. Indicio de escaladas incaicas. |