Blog do Pedro Hauck: Escalando o Tocllaraju, meu 40º 6 mil andino

8 de agosto de 2016

Escalando o Tocllaraju, meu 40º 6 mil andino

É apenas a segunda vez que venho ao Peru. Na primeira, há 15 anos atrás, estive em nosso país vizinho apenas para conhecer Cuzco e Machu Picchu. É com muito atraso que venho pela primeira vez à Cordilheira Blanca, trecho peruano dos Andes que tem 19 montanhas acima de 6 mil metros, a mais alta do país e as mais difíceis do continente.

A oportunidade surgiu por conta de uma janela de tempo entre dois trabalhos na Bolívia. Já aclimatado, por que não tentar algo por aqui?

Tomei um voo La Paz x Lima junto com Maximo Kausch e logo me lembro o motivo pelo qual demorei tanto em vir aqui. O Peru é longe, distante para ir de carro e somos obrigados a viajar de avião que é um meio de transporte incompatível com montanhismo devido a restrições de bagagem. Tudo bem, deixamos a empresa aérea mais rica e chegamos a Lima.

De taxi deixamos o aeroporto a caminho da rodoviária. “Plaza Norte”. Muita pobreza no caminho na periferia de Lima, a cidade de Callao. Contrastando com a simplicidade da região, a rodoviária é moderna e limpa e passa uma boa impressão. Tratamos de conseguir uma passagem a Huaraz e embarcamos as 10 da manhã, capotando de sono.

Dormi muito e mal pude ver a paisagem mudando e no final da tarde pude observar as primeiras montanhas nevadas se destacando em meio a uma paisagem elevada dominadas por estepes de altitude. Pouco depois o ônibus estaciona numa rodoviária particular da empresa de transporte e cá estamos em Huaraz.

A primeira impressão que tive da cidade é que ela é uma Bolívia melhorada. O povo é mais acolhedor, a comida melhor, há mais opções de refeições e bons preços, além de ser mais limpo.

Passamos um dia organizando os equipamentos e logo partimos para a primeira montanha no terceiro dia depois que pisamos no Peru. O destino é o vale de Ishinca, que dá acesso à montanha de nome homônima, o Urus, Ranrapalca e enfim o Tocllaraju.

Chegamos na entrada do vale de taxi. Algo impensável em locais como a região da Puna do Atacama. O carro nos deixa em um campo e lá um jovem nos espera com um burro, organiza a bagagem e sai na frente. Vamos atrás apenas observando a paisagem.

Conversando com um menino arriero no começo da trilha. 
Carregando o burro com equipamentos.

Rio Ishinca com suas águas azuis celestes.

Bosque de Keñuas

A trilha bem aberta e mantida sobre uma rampa de pedimentos recoberta por vegetação rasteira e entremeada por árvores de tronco grosso e casca que parece uma cebola, as Keñuas. Dali entramos no vale do rio Ishinca no meio da vertente escarpada com picos rochosos que dominam a montante. Ali a Keñua ganha um porte arbóreo e passamos a caminhar no sub-bosque ao lado do rio encachoeirado com suas águas azuis celestes.

A caminhada é prazerosa e fácil, ao ganhar altitude, deixamos a floresta para começar a caminhar em um campo plano circulado de paredes rochosas, onde um ou outro local desponta uma cachoeira gigante. Em determinado ponto o vale faz uma curva e meio que escondido desponta uma bela construção de pedra de dois andares, o refúgio Ishinca.

Acampamos na parte de fora do refúgio em um passo baixo e plano, um luxo contando que nem precisamos cozinhar, apenas pagar como comer no refúgio.

O dia seguinte foi o momento de colocar tudo na mochila e aproximar o campo alto carregados. Estava muito lento devido ao peso da comida. Mesmo assim chegamos aos 5100 metros de altitude numa caminhada de 4 horas, a tempo de cozinhar algo e dormir.

Cachoeiras gigantes na lateral do vale.

Fim do dia no acampamento base.

Acampamento base.

Noite no acampamento base.

O relógio tocou as 2 da manhã, antes disso sai da barraca para ir ao banheiro e vi a movimentação da barraca ao lado. Entretanto só começamos a caminhar as 4 da matina, bem tarde.

A noite era de lua nova, escura. Não dava para ver nada e por isso com a lanterna no modo de iluminação máximo não terminou para ela acabar e eu precisar das pilhas do GPS para continuar iluminando.

O gelo não era do melhor, estava bem derretido, formando penitentes e verglass. Porém questão de atravessar as várias gretas (abertas) até cegar na base da parede e continuar a escalada.

Galgamos uma crista de quando percebemos estávamos na base de um fungo de gelo que era o cume. Ali encontramos nossos vizinhos apressados, um italiano e um guia peruano de poucas palavras que nos avisou estarmos perto.

Ali esticamos a corda e Maximo foi na frente guiando uma seção de escalada técnica de gelo. Ele protegeu com estacas e me chamou para uma reunião. Deixei minha mochila na base eu fui escalando.

Houve mais uma enfiada de escalada em gelo técnica e quando percebemos o cume estava super perto.

No topo do fungo de gelo havia uma greta, uma pequena subida, uma greta bem grande e enfim o lugar mais alta da montanha.

A descida foi um pouco radical, com direito a um rapel no negativo no fungo, mas deu tudo certo e as 2 da tarde já estávamos no acampamento a tempo de desmontar a barraca e descer tudo de novo até o refúgio e no dia seguinte até Huaraz.

Foi uma escalada quase cirúrgica, sem perder tempo e bem precisa. Nada extraordinário, porém, sem erros. Começando com pé direito na Cordilheira Blanca e deixando tudo redondo. Meu quadragésimo 6 mil e septuagésimo cume nos Andes.

Subida ao campo alto do Tocllaraju

Caminho do campo alto do Tocllaraju

Vista para o Ranrapalca
Tocllaraju
Vista ao amanhecer.
A caminho do cume.
Vista para o cume desde a crista.
Vista para o resto da cordilheira Blanca
Travessia na ida ao cume.
Cume. Ao fundo o impressionante Chimchey
Maximo no cume.
Eu no cume.
Cume do Tocllaraju
Vista do Fungo do cume.
Tocllaraju no fim de tarde.

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