Esta não foi a melhor temporada de escalada do Peru. Com poucas nevascas no verão, não houve acumulo suficiente de neve nas montanhas e o derretimento do que ficou gerou gelo duro e muitos penitentes. Isso tudo resultou na morte de 4 pessoas no Huascarán, justamente a montanha que pretendíamos escalar nestas “férias” de duas semanas na Cordilheira Blanca, Peru.
Tivemos um insucesso no Nevado Copa, que de nevado não tinha nada, e nos restava apenas 5 dias para tentarmos outra montanha antes de voltar. Acabou que pelo tempo e pelas condições nos sobrou a opção de escalar o Chopicalqui, que com seus 6364 metros é a terceira maior montanha do maior maciço montanhoso do Peru, o do Huascarán.
De taxi saímos de Huaraz e em 3 horas chegamos no começo da trilha, pegando a estrada rumo ao norte até Yungay e de lá entrando no Parque Nacional Huascarán passando pelo setor do lago Llanganuco, um dos lugares mais visitados deste belíssimo parque. Ali conseguimos um porteador por 50 doletas (o que é bem salgado) e fomos direto da estrada até o acampamento Moraina, localizado à 5 mil metros de altitude. Apesar do ganho em altura, a trilha é curta e fizemos tudo em menos de 4 horas.
Encontramos um acampamento Moraina bem frequentado para uma montanha com um nível técnico tão alto, porém nada tão muvucado. Por conta das más condições das outras montanhas, quase todo mundo acabou indo ao Chopicalqui que era das poucas em boas condições.
Após uma noite tranquila, acordamos cedo, selecionamos bem o que levar, arrumamos a mochila e partimos rumos ao glaciar deixando uma sacola de coisas “inúteis” escondido.
A trilha estava bem marcada pelo grande número de pessoas escalando. Ela subia por uma moraina e logo montávamos no glaciar, que em sua parte terminal estava bem inconsolidada e deu trabalho, com trechos de semi escalada em gelo e gretas muito grandes, algumas com paredes negativas que nos obrigava a dar grandes saltos, mesmo com mochila cargueira.
Vencendo alguns obstáculos, chegamos a um local de acampamento onde havia duas barracas de uma pequena expedição comercial de um casal espanhol. Montamos a barraca no gelo, derretemos neve para fazer água e fomos dormir tranquilos, aliás dali era apenas 850 metros vertical até o cume.
Acordamos com o barulho de nossos vizinhos se preparando para a escalada e saímos da barraca cerca de 30 minutos depois deles. A noite estava clara com a lua cheia, mas bastou começarmos a caminhar que uma nuvem encobriu o céu por completo deixando tudo escuro. A previsão dava que a manhã daquele dia estaria limpa, mas a tarde teria 6 cm de precipitação de neve. Achei que o tempo não iria abrir e que devia ao estado de tempo, não teríamos janela... Porém, como somos insistentes, decidimos caminhar no mal tempo com esperança que o óbvio não fosse acontecer.
Subimos uma longa vertente com boa neve e atravessamos a primeira ponte de gelo numa grande greta onde encontramos um casal de alemães bivacando (e que sequer tentaram fazer cume devido ao tempo). Havia uma trilha na neve, o que facilitava muito a orientação e não demorou a encontrarmos o casal espanhol com seu guia e passarmos eles.
Ganhando altitude com velocidade, tivemos a felicidade de ver as nuvens se dissipar por volta das 4 horas da manhã, quando chegamos na base da maior parede da montanha. Com cerca de 60 metros de altura e uma inclinação de cerca 70 graus, escalamos o trecho em duas partes, onde fui incumbido de escalar a segunda, formada por uma pendente de neve em pó solta.
No topo deste ressalto, pegamos o amanhecer, mas ainda na sombra. Sentindo muito frio fizemos uma travessia na neve fofa até chegar no topo da segunda parede que vencida, ficamos pela primeira vez exposto ao caloroso sol da manhã. No topo pudemos ver a pirâmide do cume muito próximo.
Vencendo uma parte quase plana, chegamos na base da última parede, um pouco antes de uma grande greta que atravessamos numa “boa”ponte. Esta última parede era pouco inclinada e podemos escalar à francesa sem grandes problemas, para chegar ao cume castigados por um vento gélido e sendo premiados com uma vista incrível de toda a cordilheira as 8:30 da manhã, apenas 6:30 de escalada.
Mesmo cedo, não tivemos muito tempo de fotografar e filmar. Ficamos pouco tempo no topo e logo começamos a descer, pois sabíamos que o tempo não ia permanecer bem por muito tempo.
Cruzamos com o casal na última rampa e com apenas uma corda, fizemos um rapel pela metade, sendo obrigados a desescalar um tramo. Na travessia fomos alcançados pelos espanhóis e seu guia peruano e também por uma nuvem que fechou o tempo e ficamos nomeio do um “White out”. Por sorte ali pudemos usar a corda dos amigos que escalavam quase simultaneamente que nós e isso agilizou nossa descida. Na base daquela grande parede sabíamos que estávamos em casa, mesmo no meio do mal tempo.
Diminuindo o ritmo de descida chegamos no acampamento com tranquilidade, porém cansados. Chegamos até a dormir um pouco antes de desmontar o acampamento e voltar ao acampamento moraina com as cargueiras nas costas, o que foi um grande esforço numa condição de muito cansaço e um glaciar muito derretido e cheio de gretas.
Descemos o resto da montanha na sexta feira dia 19 de Agosto e no mesmo dia pegamos um ônibus para Lima encerrando assim nossa expedição peruana de 2016, aproveitando bem a última janela de bom tempo.
De fato, não foi uma boa temporada. As más condições de gelo não permitiram que fizéssemos 3 montanhas de 6 mil, mas as duas foi de bom tamanho. Foi minha primeira experiência nas montanhas da Cordilheira Blanca e gostei muito. Pude perceber que é possível fazer grandes escaladas ali, desde que as condições nos permita. Pude perceber que na Cordilheira Blanca não basta talento, é necessário muito treinamento e preparo físico. Certamente lá será um local que irei frequentar com bastante assiduidade, mas é necessário comprometimento.
O Peru é um país muito bom de viajar, tem boa estrutura, comida excelente e paisagens deslumbrantes com o preço acessível. Voltarei muitas vezes.
Trekking de aproximação ao Chopicalqui |
Chopicalqui visto do acampamento Moraina, 5000 metros. |
Acampamento Moraina no Chopicalqui, 5000 metros. |
Caminhando pelo glaciar para chegar no acampamento alto de 5500 metros. |
Glaciar bastante quebrado e ruim na subida ao acampamento alto no Chopicalqui. |
Acampamento alto do Chopicalqui, 5500 metros. No meio do gelo. |
Neve na saída do acampamento as 2 da manhã. |
Vista para o Huascarán Sul (esquerda) e Norte (direita). A primeira e segunda montanha mais alta do Peru. |
Vista para a parte sul da Cordilheira Blanca ao amanhecer. |
Maximo e o cume do Chopicalqui ao fundo |
Maximo chegando ao cume do Chopicalqui. |
Cume do Chopicalqui!!!! |
Maximo Kausch no cume do Chopicalqui. |
Pedro e Maximo no cume do Chopicalqui, Peru. |
Um dos rapeis na descida. |
E o tempo fechou. Acabou a janela de bom tempo, mas mesmo assim conseguimos. |