Blog do Pedro Hauck: Sobre a tragédia do Vale do Paraíba e Angra dos Reis

10 de janeiro de 2010

Sobre a tragédia do Vale do Paraíba e Angra dos Reis


Rio Sapucaí Mirim - Serra da Mantiqueira, 1 de Janeiro de 2010.

Todos os anos vemos esta história se repetir. Chega o verão, com ele as chuvas e junto com a água enchente e deslizamentos de terra.

Uma parte deste fenômeno é absolutamente natural e ocorre por conta da dinâmica da região natural onde se encontra a maior parte da população do Brasil, uma região natural chamada por Aziz Ab'Sáber de Domínio dos Mares de Morros florestados.

Pois bem, a explicação do porquê Aziz chama boa parte das paisagens do Sudeste deste nome já explica um pouco os motivos deste desastre. Primeiro o "Mares de morros". Bem, este nome diz respeito ao relevo do Sudeste, repleto de morros arredondados em forma de "meias laranjas" resultado de milhares de milhões de anos de clima tropical úmido com o favorecimento da evolução de solos e entalhamento dos canais de água.

Em seguida vem o nome "Florestados", bem aí não é preciso ser um gênio pra entender. Onde estão as floresta? No Estado de São Paulo existe apenas 1% da Mata Atlântica original. Ou seja por um lado o desmatamento é responsável por "desproteger" as vertentes com alto grau de instabilidade, seja pela inclinação quanto pelos solos.

Os solos profundos e desenvolvidos (latossolos) são muito antigos e apresentam diferenças entre os horizontes subsuperficiais. Há migraçào de argilas dentro dos perfis do solo e a concentração em certos horizonte provoca a dificuldade da água percolar entre os poros do solo, de forma que ela pode se concentrar e saturar uma camada de solo, que com o peso, pode ceder, mesmo com vegetação.

Foi mais mais ou menos isso o que aconteceu em Santa Catarina em 2008, quando depois de meses com muita precipitação, uma chuva fora do normal veio por desestabilizar as encostas que se liquifizes e o resultado foram corridas de lama e inundação da várzea dos rios, até mesmo em locais onde a natureza estava preservada.

Mesmo estes desastres tendo um "Q" de catastrofismo, eles poderiam ter ao menos perdas menores, se os planejadores entendessem um pouco da dinâmica natural das paisagens. Algumas simples de se prever, como o regime de chuvas durante o verão.. outras um pouco mais complexa, como a mecânica dos solos, ou até mesmo o mapeamento geológico abaixo do manto de intemperismo, já que existe uma grande relação entre ravinamentos e erosão, com falhas geológicas, que são mais frequentes do que vocês imaginam.

Obviamente não há como evitar uma chuva fora do normal, mas podemos evitar o assoreamento dos rios, também a ocupação das várzeas, o mesmo com a ocupação das encostas e o desmatamento delas...

O pior de tudo é que isso continuará acontecendo, pois a propria sociedade não valoriza os conhecimentos da dinâmica da paisagem. Procure nos concursos dos orgãos ambientais a relação de vagas entre quem tem o conhecimento técnico e o cientifico? Quantas empresas tem geógrafos, biólogos e ecólogos em seu efetivo? pouquíssimo.... Pra piorar, na formação de engenheiros não existe discpinas como por exemplo Geomorfologia, ou qualquer outra de Geografia Física.


Enfim, para mudar estas tragédias, é preciso haver uma evolução na propria mentalidade do povo brasileiro que é demais pragmático e desvaloriza todo e qualquer conhecimento que não serve pra ganhar dinheiro. A experiencia mostra que ignorar este tipo de conhecimento é muito pior...


Cheia no Rio Sapucaí Mirim - MG


Rodovia São José dos Campos - Monteiro Lobato. 1 de Janeiro de 2010.


Cheia no dia 1 de Janeiro em Monteiro Lobato - SP


Como ficou no dia seguinte, ainda cheio....


Várzea ainda cheia e morros em "meia laranja" sem vegetação florestal.

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