Blog do Pedro Hauck: Qual é o papel de um clube na escalada?

12 de fevereiro de 2009

Qual é o papel de um clube na escalada?

Publiquei este texto ontem no site do Clube Paranaense de Montanhismo, o qual sou diretor de escalada, achei que ia dar o que falar, mas ninguém até agora se expressou. Irei reproduzi-lo aqui, quem sabe então haverá comentários...



Durante a seletiva nacional para formar a seleção brasileira juvenil de escalada, um dos idealizadores do projeto proferiu um discurso em prol da escalada brasileira, explicando os objetivos da seleção e valorizando os clubes e as federações. Entretanto fica uma questão: Será que os clubes estão fazendo seu dever de casa? Veja o exemplo e as dificuldades do CPM.

Em uma coluna no site altamontanha.com, eu expus minha percepção sobre o momento atual da escalada no Brasil, que acredito estar sofrendo um retrocesso. Vários foram os motivos que me levaram à esta conclusão: Picos de escalada com menos frequentadores e muitas proibições, lojas e ginásios fechando, campeonatos vazios, revistas de escalada falindo, pouco interesse de empresas em apoiar a atividade.

A escalada é uma das atividades do montanhismo, eu diria que é a parte técnica deste meio, sendo que há uma escalada mais tradicional em que o objetivo é subir montanhas e também há uma parte esportiva onde ocorre os campeonatos. Não existe uma escalada melhor que outra, há sim vertentes distintas, mas ao meu ver a escalada esportiva de competição é das atividades mais prestigiadas e visíveis do meio montanhístico, embora ocorra distante das montanhas.

Com o surgimento dos ginásios, a escalada esportiva ganhou muitos adeptos e se tornou mais popular do que a escalada tradicional. Isso trouxe uma certa popularidade, sendo que os ginásios se tornaram porta de entrada à vários jovens que se tornaram grandes escaladores. Entretanto, nem todos se tornam "montanhistas" no sentido conceitual da palavra. Talvez por isso, ao passar do tempo, houve todo este distanciamento da escalada com o montanhismo, ao ponto que em 2007 foi criada a IFSC (International Federation of Sport Climbing), separando-se da UIAA (União internacional das federações de montanhismo).

No Brasil este distanciamento foi ao longo do tempo esvaziando os clubes de montanhismo, que se tornaram "centros de excursionismo", onde atividades de escalada se tornaram cada vez mais raras ao ponto que não foi se renovando os associados escaladores, estes, por fim cada vez mais independentes.

É por este motivo que as federações estaduais (com excessão do Rio, por causa da acessível escalada urbana) se esvaziaram e se endividaram, não conseguindo sequer executar projetos para os montanhistas e sequer para os escaladores. Mas não achem que estes últimos, por estarem munidos da possibilidade de organizar campeonatos ficaram nadando no dinheiro, pelo contrário.

As associações de escalada sempre enfrentaram dificuldades, mesmo tendo alto poder apelativo por causa das competições, talvez pelo pragmatismo dos empresários brasileiros que querem para cada real investido, receberem mais de cem! Os campeonatos foram cheios entre o final da década de 90 até mais ou menos 2003. Mas com a falta de apoio, premiações ridículas e baixa renovação, logo eles também sofreram com o retrocesso, ao ponto de que na última etapa do brasileiro de 2008 haviam somente 7 atletas competindo!

O projeto pro-escalar, idealizado pela AEEP e homologado pela CBME e FEPAM, tem como objetivo reverter este quadro. Para isso eles buscaram qualificar-se, enviando Anderson Gouveia, um dos melhores escaladores de Curitiba, para certificar-se Route Setter pela IFSC. Além de organizar e conseguir apoio para formar uma seleção de jovens atletas que irão competir num mundial, este projeto visa organizar a escalada esportiva e dar sangue novo ao esporte e isso passa pela federação dos escaladores, valorizando os clubes e associações.

A escalada esportiva é um esporte de alto rendimento, exige muito do atleta e poucos chegarão à um nível para conseguir competir numa final de Copa do Mundo, mas não duvido que deste grupo seleto de jovens haverão até mesmo futuros campeões. Entretanto o mais importante deste projeto não formar um campeão mundial, mas sim incentivar os jovens a praticar escalada.

Tenho certeza que mais do que campeões, o projeto pro-escalar irá formar escaladores concientes e vai disseminar a cultura do montanhismo, se houver, é claro um trabalho por trás e aí que entra o clube.

De que adianta dermos apoio aos jovens para escalar se não passarmos a eles nossa experiência? Mais do que levar estes jovens ao ginásio, temos que levar eles à nossas rochas e montanhas e resgatar os valores existentes na cultura do montanhismo.

Por isso acredito que nosso Clube de montanha tem que abraçar este projeto, dar suporte aos atletas e também trazer estas pessoas para dentro do CPM. Para isso acontecer todos têm que ajudar, pois senão perderemos esta chance de reverter este processo de pragmatização do montanhismo. Se o clube não exercer seu papel de porta de entrada para a escalada e montanhismo, o projeto pro-escalar estará fadado a continuar na mesmisse, pois somente os jovens com melhores condições estarão aptos de participar de uma seletiva e ocorrerão novamente categorias com somente dois participantes.

Os clubes têm que realizar um trabalho de base no fomento de novos escaladores, mas isso também só ocorrerá se os mais experiêntes ajudarem, ou melhor, se os mais experiêntes abraçarem o clube, pois o que tenho visto é que estas pessoas deixam de frequentar os clubes quando não mais precisam deles e esta é a maior dificuldade do CPM, onde estão os escaladores experiêntes que por lá passaram???

Na atualidade não temos como pagar por um projeto. Tudo tem que ser feito voluntariamente e aí espero que a conciência dos mais experientes pese à favor da escalada e do montanhismo, pois se não foi o montanhismo o que melhorou nossas vidas, onde está a retribuição para melhorar aquilo que tanto gostamos?

Espero que todos os sócios ajudem neste árduo trabalho e também que os montanhistas e escaladores independentes se unam a nós para lutar por algo em comum: A valorização, reconhecimento e desenvolvimento da cultura da montanha no Brasil.

Junte-se a nós!

Foto: Luan Wagner de Oliveira, 16 anos, campeão paranaense iniciante 2008, 8 lugar na seletiva na categoria juvenil A em sua segunda vez no Anhangava, 8 de Fevereiro de 2009.

Um comentário:

Davi Augusto Marski Filho disse...

excelente texto. Aqui no GEEU passamos por um "problema" de certa forma parecido, que é a total falta de interesse do pessoal em praticar montanhismo... foca-se apenas na atividade física da escalada esportiva indoor e pronto. Claro, há excesssões... Vou tomar a liberdade de reproduzir o seu texto com o grupo do GEEU. Abs e boa semana