Blog do Pedro Hauck: Juquices do meu avô

2 de agosto de 2017

Juquices do meu avô

Meu avô Juca era um sujeito um tanto folclórico, uma grande figura. Dentre suas manias, chamava a atenção sua preocupação exagerada contra o desperdício. Ele não jogava nada fora que não achasse que fosse um dia precisar. Um pote de manteiga poderia guardar pregos, um parafuso arrumar um aparelho defeituoso e até jornal velho poderia dar uma noticia nova. O exagero era tão grande, que o hábito de guardar tranqueiras, ainda mais seguido com o hábito de esquecê-las, quando poderiam ser úteis, virou um verbo na família: Jucar.

Acho que consegui me livrar de algumas Juquíces que pudessem ser hereditárias, eis que um dia me vi cair de cabeça, literalmente, em uma delas.

Morando em Curitiba há 5 anos, pude praticar o hábito de separar lixo reciclável. Cidade verde, capital ecológica e povo politicamente correto é assim. O condomínio onde moro segue a fama da cidade e tem uma estrutura especial para guardar aquilo que ninguém mais quer: o lixo. São 5 tampas metálicas sobre uma estrutura de alvenaria que quando abrimos temos acesso a grandes tambores de plástico, aonde é descartado o lixo. Estes tambores, por sua vez, são acessados da rua por um portão que só o lixeiro e o porteiro têm a chave.

Numa certa tarde, estava jogando meus recicláveis fora, quando ao abrir a tampa metálica do lixo vejo dentro do tambor uma embalagem de pizza intacta. Até aí tudo bem, a caixa de pizza estava dentro do reciclável, não tinha nada orgânico, a não ser uns restinhos de queijo e um cheirinho residual de chorume. O “X” da questão era que a tal caixa de pizza era de uma pizzaria que fica em frente ao condomínio que tem a seguinte promoção: Juntando 10 selos presentes na embalagem de uma pizza gigante, você ganha uma pizza grátis. Eu já tinha 9 selos em casa e tinha a chance de completar meu prêmio. Sem ter faca ou canivete em mãos, cortei a embalagem com a chave de casa que num descuido caiu dentro do tambor.

Fiquei sem saber o que fazer. Chamar o porteiro para ele abrir o portão por onde entra o lixeiro demandaria muito tempo, ignorar a chave e ficar com uma cópia seria impossível, pois sem aquela, não dava para entrar no apartamento. Espertamente optei pela possibilidade mais fácil, rápida e inteligente.

Chamei minha namorada, que estava no carro, para segurar a tampa do latão, ao tempo em que me debrucei sobre o lixo. A chave estava muito abaixo no tambor, precisei remover umas latas, uns papeis e caixas de papelão, mas não a encontrava. Pior ainda, o tambor era alto e não alcança o fundo para poder vasculhar e encontrar aquele maldito material metálico tão perfeitamente camuflado com outros lixos.

Não podia falhar em minha tentativa, debrucei mais, ficando apenas com minha barriga apoiada na boca da tampa de latão, mas com o tórax e a cabeça enfiada no lixo. Neste momento, minha namorada teve que segurar minha perna, para eu não cair de cabeça no tambor, até poder vasculhar seu interior e achar meu tesouro.

Minha sorte é que estou um pouco acima do peso e as calças agüentaram firme. Se eu tivesse feito isso na volta de uma expedição em montanha, certamente teria caído de cabeça no fundo do lixo e ainda teria ficado sem calça...

Engane-se que o tesouro foi ter recuperado a chave. Pizza de graça não tem preço! E não se esqueça, um dia você irá conjugar este verbo também:

Eu Juco, tu jucas, ele juca, nós jucamos, vós jucais eles jucam.

Este mes fez 5 anos que meu avô partiu, saudades das juquices....

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