Escalar o Illimani é um sonho para todo montanhista. Primeiro porque é uma montanha belíssima e muito representativa, já que de quase qualquer lugar de La Paz você pode ver ela. É um dos símbolos da Bolívia e o maior símbolo da capital deste país.
A montanha fica apenas 50 km de La Pazl, é perto, mas a estrada até lá é uma história à parte, sendo preciso cruzar toda a cidade. Na parte da cidade onde estamos, ela é cheia de edifícios históricos, com suas ruas repletas de feiras e com trânsito caótico. Descendo a Avenida Mariscal Santa Cruz, se passa por vários prédios modernos até chegar na zona Sul que é uma cidade totalmente diferente daquela na zona norte. Lá a maoiria população é branca, rica e a arquitetura é moderna, com muitos casarões e sem trânsito caótico.
Deixando esta parte nobre da cidade, a gente começa a subir uns morros, passando por uma periferia mais humilde, mas muito melhor do que aquela miséria que se vê em El Alto, cidade satélite que fica no altiplano. Aos poucos as casas vão ficando ainda mais humildes e mais dispersas, até que se chega em um morro, onde há um grande mirante para o Illimani. Ali fica claramente uma divisão entre o urbano e o rural de La Paz, pois em seguida o que se vê são aglomerações de casinhas e muito espaço livre para a criação de alguns animais, principalmente algumas vacas e muitas ovelhas.
Ali vamos serpenteando uma estrada pavimentada de pedra. A paisagem é espetacular, sempre tendo o Illimani ao fundo. Ao ponto que vamos descendo o vale, a estrada vai ficando cada vez mais rural e sem a presença de muitos moradores, até que ela fica de terra e começa a perder altitude rápidamente.
Chegando ao fundo do vale, se chega à uma cidade pra lá de pitoresca: Palca. Ali há um pequeno rio, uma ponte antiga de pedra em um estilo medieval. Uma igreja antiga em estilo barroco, uma praça com alguns índios parados e casinhas de adobe enfileiradas em uma rua estreita que só passa um carro, pronto acabou Palca e já estamos na estrada empoeirada e super povoada pelo povo Aymará, suas casinhas e criação de animais.
Passando esta cidade, atravessamos o vale em perpendicular. Lá a estrada só cabe um carro e o que se vê é um precipício para baixo, com um riozinho caudaloso há centenas de metros de você e um precipício pra cima, com uma montanha em sua cabeça. É preciso andar devagar e buzinando em todas as curvas, para que nenhum outro carro venha na contramão e te golpeie de frente. É um perigo a estrada.
São diversos sobes e desces nesta estrada de 50 km, em nenhum momento cheguei a engatar a terceira marcha do carro, por isso demoramos duas horas e meia para chegar em Pinaya, que é o acesso ao acampamento base do Illimani.
Pinaya é uma comunidade rural com muitas casinhas bastante povoada. Isso que hoje se chama de "comuna" pode ser simplesmente o que restou do sistema incaico de distribuição de terras chamado de "Ayllu". Tudo ali tem influencia Inca: As construções das casas, o sistema de irrigação de acéquias, as terraças nas montanhas, as culturas que são plantadas e até mesmo o idioma que se fala lá: O Aymará! O que mudou é que hoje além de terem criação de Lhamas, eles têm também de vacas, de ovelhas, porcos e tem muitos cachorros de estimação.
Deixei meu carro estacionado ao lado da casa de uma índia cujo nome não consegui pronunciar. Ela fala muito pouco espanhol, mas com ajuda de uma criança expliquei à ela que pagaria 10 Bolivianos por dia para usar sua "cochera" ela ficou muito feliz e topou o negócio. Logo depois de deixar tudo pronto, eu e o Maximo começamos a caminhar rumo à montanha, com o sol já bem fraco deixando o branco dos cumes do Illimani mais rosado.
Acabamos pegando um caminho errado e fomos parar em uma antiga estrada de mineiros, que igualmente nos deixou no campo base da montanha 2 horas e meia mais tarde, já à noite com uma bela vista para a imponente montanha branca, o céu estrelado e ao fundo as luzes de La Paz e El Alto.
Acordamos bem no dia seguinte, pois este acampamento é muito confortável, todo gramado e com muita água, sem falar que é bem plano e grande. Arrumamos nossas mochilas e partimos para o acampamento alto, mais conhecido como "Nido de Condores".
A aproximação à Nido é daquelas bem ingratas. São exatamente mil metros de subida. Quando você já está cansado de subir, é que vem o pior trecho, pois no final engata-se em um filo rochoso e ali é preciso quase escalar alguns trechos, tendo o detalhe que não há nenhuma segurança e há precipícios para ambos os lados, e você com uma mochila cargueira. Não caia!
Vencido os trepas pedras umedecidos com a presença de neve, você chega em Nido de Condores, um pequeno platô onde cabem cerca de 7 barracas bem montadas. Ali estamos há 5400 metros e a vista é fenomenal. Se vê La Paz, todo o altiplano, uma parte do Lago Titikaka, os vales da Cordilheira real e suas montanhas e até as montanhas da Cordilheira Ocidental, há mais de 200 quilômetros em linha reta na fronteira do Chile, principalmente o gigante Sajama e os Payachatas.
No acampamento haviam outras expedições: espanhóis que chegaram junto a nós, chilenos, americanos, argentinos, um inglês e uma alemã. Todos estavam apreensivos, pois há duas semanas ninguém fazia cume ali devido às nevascas que havia fechado a trilha. Sim, aquelas nevascas que pegamos no Sajama estavam agora impedindo o acesso ao Illimani.
Conversamos um pouco e combinamos de todos fazerem a ascensão juntos, saindo bem cedo, às 2 da manhã para revezar no trabalho de abrir a rota em meio à neve funda. Fomos dormir cedo e avisei ao Maximo que no final somente nós abriríamos essa rota e reclamei por termos combinado de acordar tão cedo, já que de madrugada faz muito frio e não se encherga nada.
Acordei antes do relógio despertar, comemos uma feijoada em lata cada um para dar energia à empreitada e acabamos por ser os últimos a sair do acampamento, com uma hora de atraso.
Logo estávamos seguindo as pegadas deixadas na neve pelas outras pessoas e em uma hora já havíamos ultrapassado todos os outros montanhistas exatamente antes de encontrarmos o primeiro trecho "técnico" da rota, que é um escalão de cerca de 10 metros, que estava repleto de neve em pó, logo após uma greta. Dali em diante já não havia mais pegadas e ficou eu e o Maximo navegando no escuro à procura da rota.
Fomos subindo a montanha e logo fomos encontrando mais gretas, sempre procurando um caminho para a ascensão desviando delas. Max foi na frente abrindo pegadas na neve usando minha potente lanterna para iluminar um pouco melhor à escuridão, eu ia em sua cola dando palpites e tentando interpretar o caminho com ele. Era como se fosse uma primeira ascensão, pois não havia ali nenhum vestígio humano, para piorar, a lua havia se posto e nosso raio de interpretação do terreno era até onde chegava o foco de luz da lanterna.
Em um determinado momento chegamos em uma greta grande. Já fazia muito frio e tivemos que usar nossas jaquetas de pluma de ganso. Naquele lugar atravessamos a greta por uma ponte e começamos a escalar um trecho íngreme de 50 graus que fizemos em zig-zag. Neste momento estávamos no meio de uma nuvem e começava a se formar alguns ventos brancos bem gelados. Poucas vezes pude olhar pra trás e ver o terreno lá embaixo. As lanterninhas dos outros montanhistas mostrava como íngreme era o trecho que apesar de fácil, é proibido de cair!
Após vencer este lance, chegamos em outra greta, muito maior. Lá Maximo ficou procurando o caminho e em meio às nuvens e ao vento branco, encontramos, contornando a greta por baixo e pela esquerda, um caminho que não era muito óbvio e que nos levou à rampa final do cume. Quase achei que havíamos escalado pelo lugar errado, mas estava tudo indo bem.
Neste momento se aproximou de nós um montanhista chileno, que nos acompanhou neste último trecho. De principio o céu estava encoberto pela nuvem, mas olhando para cima, vimos o vento varrer um pouco do mal tempo e pudemos ver o cume e o céu azul, foi um êxtase em meio ao cansaço.
Acabei me empolgando e me distanciei do chileno e do Maximo. Ao chegar perto do cume, o presente: As fortes rajadas de vento que antes nos castigava, acabou por afastar do cume as nuvens e tivemos 360 graus de vista lá de cima que mesmo com rajadas de ventos brancos foi totalmente extasiante. Novamente minha respiração congelou em minha blusa e minha mochila, assim como toda minha roupa ficaram brancas, mas nem liguei, a alegria de chegar no cume e ter aquela visão me fez esquecer do frio e do cansaço.
Acabou que minha previsão foi acertada. Sozinhos liberamos a rota e abrimos caminho em meio à neve para todo mundo fazer cume, menos os argentinos e os americanos que desistiram no meio do caminho. Chegamos no cume às 8 da manhã, sendo que no total caminhamos por 5 horas na subida, muito rápido para as condições que pegamos. A descida foi de apenas 2 horas e meia.
Chegamos em Nido de Condores óbviamente muito cansados e quase que dormindo na barraca ouvimos horas mais tarde os outros montanhistas chegarem. Poucos reconheceram o trabalho do Maximo em abrir o caminho e logo já foram desmontando suas barracas para que seus carredores levassem as tralhas de volta à Pinaya. Fomos os últimos à descer, junto com a alemã e o inglês, dormimos todos no confortável acampamento base da montanha com a sensação de dever cumprido e nós ainda mais orgulhosos por termos sido os primeiros a fazer cume depois de todo este festival de mal tempo que esteve assolando e atrapalhando nossas vidas na Bolívia.
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:: Assista aos vídeos da escalada no Illimani
:: Veja o tracklog do Illimani no Rumos: Navegação em Montanhas!
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O Illimani e a estrada que leva à ele.
Pra sentir o drama dos precipícios!
Aproximação do campo base no pôr do sol.
Acampamento base.
Nuvens e vento branco no cume do Illimani.
Subindo para Nido de Condores.
O filo perto de Nido
Acampamento Nido de Condores
Vista para o cume central do Illimani desde Nido
Eu em Nido
Dentro da barraca
Pôr do sol em Nido
Subindo logo após o amanhecer
Mal tempo pela manhã!
Abrindo caminho
Maximo chegando no cume no Illimani.
Eu no cume e o maximo vindo ao fundo.
Vista do cume para a região amazônica.
Maximo e eu no cume!
Maximo
No cume, tentando imitar Tenzing Norgay
Olha quem foi comigo lá em cima!
Homenagem à Nomade, unica marca de equipo de montanha que me ajudou.
Homenagem ao meu clube de montanhismo.
Eu e Max na descida de Nido de Condores.
Maximo se entendendo com as lhamas do Illimani
Pra sentir o drama dos precipícios!
Aproximação do campo base no pôr do sol.
Acampamento base.
Nuvens e vento branco no cume do Illimani.
Subindo para Nido de Condores.
O filo perto de Nido
Acampamento Nido de Condores
Vista para o cume central do Illimani desde Nido
Eu em Nido
Dentro da barraca
Pôr do sol em Nido
Subindo logo após o amanhecer
Mal tempo pela manhã!
Abrindo caminho
Maximo chegando no cume no Illimani.
Eu no cume e o maximo vindo ao fundo.
Vista do cume para a região amazônica.
Maximo e eu no cume!
Maximo
No cume, tentando imitar Tenzing Norgay
Olha quem foi comigo lá em cima!
Homenagem à Nomade, unica marca de equipo de montanha que me ajudou.
Homenagem ao meu clube de montanhismo.
Eu e Max na descida de Nido de Condores.
Maximo se entendendo com as lhamas do Illimani